22 singles que a Primavera 2022 nos trouxe

 

Estamos mais perto de abraçar o Verão do que continuar nos braços da Primavera, mas a vida é um fósforo e corre veloz por estes dias. Este é, portanto, o resumo dos últimos três meses de memórias, histórias, glórias, receios e esperanças em formato de canções:
 
1) Mabel, Jax Jones & Galantis- "Good Luck"- Apresentado pela primeira vez no final do vídeo de "Let them Know", foi ainda preciso esperar nove meses até conhecermos "Good Luck" na íntegra: sólida construcção dance-pop via 90s ladeada por Jax Jones e os suecos Galantis, enviada como kiss-off ao antigo boo

2) David Guetta, Becky Hill & Ella Henderson- "Crazy What Love Can Do"- Ideia de génio esta, de juntar as maiores powerhouses vocais britânicas para uma sumarenta colaboração EDM sobre o poder do amor e da amizade, entregue em embrulho noughties. Becky cumpre, como sempre, mas é Henderson quem rouba os holofotes. 

3) Chloe- "Treat Me"- Enquanto Normani continua presa às suas indecisões crónicas, outra lenda se ergue e arrisca-se a ocupar o lugar que era dela por direito. Depois do retumbante "Have Mercy", outro compelativo objecto pop-rap lhe sucede: a estética, o aprumo, a transgressão, a confiança granítica. Vénias a vós, majestade.

4) Sky Ferreira- "Don't Forget"- O mundo é um lugar inóspito por estes dias, mas depois temos pequenos rasgos de luz como este, que nos trouxe o regresso de Sky Ferreira - depois do falso arranque em 2019 com "Downhill Lullaby" - e um vislumbre do eternamente adiado Masochism, com a fúria impiedosa noise pop/new wave de "Don't Forget", misto de Twin Peaks com Stranger Things e imensa aura de femme fatale. Que não falhe o embalo. 

5) Harry Styles- "As It Was"- Declarado Rei da Primavera, Mr. Styles continua a levar o seu fantabulástico destino a solo a novos patamares de aclamação comercial com "As It Was", o maior hit da temporada, da mesma costela synthpop acelerada de "Blinding Lights" ou do sucedâneo de 2021 de Kid Laroi e Bieber, "Stay", que trouxe de arrasto um álbum igualmente charmoso. 

6) Jack Harlow- "First Class"- Crónica da sua jornada até ao estrelato e da ostentação encontrada além-holofotes, este foi o tema que colocou Jack Harlow definitivamente na primeira liga do hip hop, com entrada directa para o topo da Billboard Hot 100, abençoado por um sample do intemporal "Glamorous", de Fergie e Ludacris. 

7) Camila Cabello feat. Willow- "Psychofreak"- No caminho promocional que nos levou a Familia, Camila entregou-nos a dada altura este intrigante pedaço de trip hop/emo latino sobre as oscilações da sua saúde mental, coadjuvada por uma intrépida e sonante Willow, a funcionar como a voz da sua consciência - e a tornar-se no superlativo absoluto da canção. 

8) Megan Thee Stallion & Dua Lipa- "Sweetest Pie"- Não era de todo o primeiro par que nos vinha à memória quando falamos em team-ups no feminino, mas "Sweetest Pie" cumpre um propósito para as suas intérpretes: para Megan significa uma diluição maior no campeonato pop a que também quer pertencer, enquanto para Dua uma intensificação dos seus avanços no mercado urbano norte-americano. Funciona q.b e vem ilustrado com um fantasioso vídeo de Dave Meyers. 

9) Rosalía- "Candy"- Motomami é um dos prodígios do ano, e deve-o a canções encantatórias como este "Candy", a conjurar feitiços alt reggaeton em combustão lenta sobre "Archangel" de Burial, numa elegia a um relacionamento em estado terminal. 

10) Charli XCX- "Used to Know Me"- A sell-out era da Mother XCX não poderia estar completa sem o tratamento de vídeo para "Used to Know Me" - argumento de peso de Crash construído em torno de um sample desse megalítico monumento europop que é "Show Me Love" de Robin S. - que passa em revista as várias fases da sua carreira, em absoluto estado de delírio grandiloquente. 

11) Tove Styrke- "Hardcore"- O quarto álbum da sueca Tove Styrke estava a ganhar uma forma e conceito disconexos, até que "Hardcore" chegou e moldou tudo com estrondo: ópera electropop sobre querer outro alguém de forma ardente, conta com intrigantes mudanças de tempo e versos debitados numa quase embriaguez de desejo. A T cruzou o firmamento.

12) Disclosure & Raye- "Waterfall"- Os irmãos Lawrence praticamente fizeram a Primavera no departamento da electrónica com esta etérea cascata deep house sobre amar alguém na sua plenitude, que concede a Raye o seu melhor momento musical desde que cortou amarras com a Polydor e se soltou na independência. Água bendita. 

13) Lizzo- "About Damn Time"- Quantos boosts do TikTok poderá Lizzo receber ao longo da sua carreira? O primeiro avanço de Special não parecia vir a tornar-se num êxito de grandes dimensões, mas o seu balanço disco-funk, sempre apoiado pelo charme lírico e vocal da sua autora, revelou-se um trunfo seguríssimo. O empurrão viral fez o resto - e aí a temos a brilhar, uma vez mais. 

14) Nathan Dawe & Ella Henderson- "21 Reasons"- O hot streak de Ella em 2022 é uma coisa real - e esta é porventura a melhor colaboração EDM em que alguma vez se viu metida. Em parte porque a sua voz resplandece no molde sonoro que Nathan Dawe lhe proporcionou, mas a estrela aqui é mesmo a fabulosa utilização de "Calabria", popularizado em 2007 pelo DJ italiano Alex Gaudino, imbuído agora de nova vida e vigor. 

15) Shakira & Rauw Alejandro- "Te Felicito"- Todos estranhámos que o single de regresso de Shakira - após o passo em falso que foi "Don't Wait Up" - fosse mais delator que o costume, agora explicado pela suposta infidelidade de Piqué no casamento. O resultado é um aceso pedaço de electro-reggaeton ferido, condimentado pela doce chama de Rauw Alejandro. 

16) Calvin Harris, Dua Lipa & Young Thug- "Potion"- Até hoje não houve repetição de colaboração no catálogo do DJ escocês que não fosse mais fraca que a primeira, à excepção da tríade maravilha que criou com Rihanna. Deusalipa não foge à regra e percorre o novo tomo de Funk Wav Bounces com extremo sexappeal, mas sem o calor que "One Kiss" despertou. Melhor do que nada, ainda assim. 

17) Ava Max- "Maybe You're the Problem"- Há uma clara disconexão no arranque da nova era de Ava Max: a capa transmite vibes de Xtina circa "Dirrty" (2002), mas depois a proposta sonora transpõe a dance pop que já praticava para a década de 80, num novo "Blinding Lights" que ninguém pediu. E depois ainda há o vídeo em tons retro e invernosos, opostos à Primavera que se faz sentir. Mais bom-senso da próxima vez, por favor. 

18) Sam Smith- "Love Me More"- Muitos pontos positivos em mais um começo de era para Sam Smith: a reflexividade e positivismo que a canção irradia, a produção pop suculenta com ténues laivos de R&B e a aura 90s conferida pelos habituais colaboradores, Stargate e Jimmy Napes, o forte desempenho vocal, como de costume, e a sensação de uma maior clareza criativa. 

19) Florence and the Machine- "My Love"- O regresso de Flo e a sua máquina já nos deu diferentes tons. "My Love", porventura o single mais sonante de Dance Fever, pega na grandiloquência art rock de "No Light, No Light" e no júbilo electro-house da remistura de Calvin Harris para "Spectrum (Say My Name)", cortesia de Dave Bayley, o homem forte dos Glass Animals, de forma a criar um majestoso monumento art disco sobre a asfixia criativa provocada pela pandemia. 

20) Pabllo Vittar feat. Rina Sawayama- "Follow Me"- É desta emocionante inconstância que vive muito do triunfo de Pabllo Vittar: depois da incursão pelo forró e tecnobrega de Batidão Tropical, da comunhão funk e k-pop de "Number One", a divindade faz novo royal flush com mais uma colaboração internacional de alto gabarito, ladeada por Rina Sawayama num hiper-futurista "Follow Me" que leva voguePantera Cor de Rosa e moda space age à la Jetsons para a catwalk

21) Maggie Rogers- "That's Where I Am"- É uma nova vida para Maggie Rogers. A voz de "Alaska" tomou o seu tempo entre Heard It in a Past Life (2019) e Surrender, com edição marcada para 29 de Julho, e o resultado é uma autora consciente da sua voz e do seu potencial, decididamente mais eléctrica e próxima tanto a nível visual como interpretativo da malograda Dolores O'Riordan. 

22) The Weeknd- "Out of Time"- Abel está a sofrer as consequências da sobrexposição, e por isso se explica que um álbum tão capaz quanto Dawn FM esteja abaixo do seu potencial comercial - e que os seus singles estejam a sofrer com isso. "Out of Time", R&B/city pop suave digno da rádio de GTA é o mais recente exemplo do desgaste que enfrenta. Tantas pérolas deitadas fora...

 
 E agora sim, Verão, podes instalar-te.

Comentários

Mensagens populares