Odisseia Musical: 2012, Metamorfose- Parte II

Aventurar-me na crítica de discos foi, possivelmente, das decisões mais ponderadas e corajosas que alguma vez tomei. Não sentia que estava preparado para o fazer, mas tinha necessidade de me desafiar e provar que era capaz. Assim nasce o 'Record Collection'.

Sempre tive um grande respeito por quem dedica a sua vida à audição e apreciação de álbuns, mas nunca soube o que tal tarefa exigia até ao dia em que comecei a fazer as minhas próprias leituras. É um trabalho laborioso e exaustivo que nos leva a mergulhar a fundo na obra do artista e que exige um ouvido hábil, atento aos pormenores e capaz de filtrar diferentes texturas e sonoridades.

Não gosto de chamar "crítica" àquilo que faço porque acho que a palavra implica um rigor e conhecimento profissional que ainda não possuo e espero sinceramente um dia vir a possuir. O que faço é sobretudo uma apreciação intensiva, fruto de uma grande dedicação e paixão pela música. De outra forma também não seria possível fazê-lo.

Gosto de pensar que ninguém faz apreciações iguais às minhas. Procuro sempre saber qual a história e as intenções por detrás do disco, perco-me pela sua ficha técnica, consultando os produtores e compositores, demoro-me na leitura das letras, fundamentais para compreender as canções, e tento sempre escutar o álbum pelo menos três vezes antes de proceder à sua análise. Depois é discorrer livremente acerca dele com o máximo de honestidade possível.

Como perfeccionista e minucioso que sou, gosto de falar dos discos canção-a-canção porque acho que é importante referir e avaliar as várias camadas que os compõem. Além disso, procuro tentar transmitir sempre as emoções e sensações que me invadem no decorrer da sua audição, porque a música é sobretudo isso. Escrevo com o coração e não com a razão, sem nenhum outro propósito que não o de ser o mais honesto e justo possível no decorrer do processo.

Agora que passam dois anos desde a primeira análise e que cheguei recentemente à review nº50, acho que já posso eleger os mais marcantes. São eles: Yeezus e Night Time, My Time pela dificuldade; The 20/20 Experience, Pure Heroine e o homónimo dos Paramore pelo prazer que me deram; o último de Beyoncé e Desfado de Ana Moura, porque aconteceu ali algo de especial. Espero que venham mais 50, 100 e 1000, sempre a evoluir e com a paixão, o respeito e o brilho no olhar do primeiro dia. 

Os temas que mais me marcaram

9º Fun. feat. Janelle Monáe- "We Are Young", Some Nights

Os nova-iorquinos fun. tinham lançado em 2009 um álbum de estreia francamente discreto, mas ambicionavam ser mais do que uma banda entre tantas confinada ao circuito indie. Até que um dia um telefonema mudou tudo. Isso e uma boa capacidade persuasiva para que Jeff Bhasker, então ocupado com Beyoncé, Kanye e Jay-Z, aceitasse trabalhar com este trio vindo de nenhures num projecto que pretendia misturar pop/rock a batidas hip hop e efeitos electrónicos. Assim nasce "We Are Young", apresentado ao mundo primeiro em Glee e mais tarde impulsionado pela sua inclusão num anúncio do Super Bowl. Resisti-lhe com todas as minhas forças até não conseguir mais ignorar que isto era a explosão da revolução indie pop iniciada um ano antes com "Pumped Up Kicks". E foi maravilhoso, absolutamente maravilhoso de assistir. O resto é conversa.



8º Rihanna- "Where Have You Been", Talk That Talk

Recordo-me da sensação de assombro que tive ao ouvir isto pela primeira vez, desejando desde logo que se tornasse num futuro single. Exactamente o mesmo que senti ao escutar "Don't Stop the Music", cinco anos antes. Faz sentido, se pensarmos que são dois mega-colossos da pista de dança e que marcam as experiências mais admiráveis da sua carreira nos domínios da house music. "Where Have You Been" é o tal hit monstruoso que foi abafado pelo gigantesco sucesso de "We Found Love" e chegou numa altura em que a carreira de Rihanna já pedia uma pausa urgente. Talvez por isso não tenha tido semelhante impacto. A acompanhá-lo tem um dos meus trabalhos predilectos da sua videografia, pelo misticismo e consistente desempenho coreográfico que o envolve.



7º Everything Everything- "Cough Cough", Arc

Yeah...so...um...wait a second! Esta tem lugar na lista das canções que podem mudar a vida de uma pessoa. A minha mudou certamente, porque depois dela não voltei a ser o mesmo. Associo-a ao momento em que passo a sintonizar a Vodafone Fm, a ter um maior conhecimento da cultura indie e a apaixonar-me definitivamente por ela. E depois, caramba, é mesmo uma grande canção que trucida tudo e todos à sua passagem. E é tão fácil perdermo-nos na sua megalomania sonora que nos esquecemos que isto é também um tremendo manifesto político, à tirania e opressão do governo. But I'm coming alive, I'm happening now. Cough Cough.



Os álbuns que mais me marcaram

4º Rihanna- Unapologetic

Não se deixem enganar pela posição à margem do pódio. Unapologetic é, para todos os efeitos, o melhor álbum editado por Rihanna desde Rated R (2009) e, como tal, um dos meus favoritos da sua discografia. A concorrência é que é mesmo muito forte. O 7º disco da sua carreira foi o seu quarto lançamento consecutivo em quatro anos e chegou numa altura em que a sua imagem acusava já um grande desgaste. Uma nova investida nos domínios da house music teria sido fatal, mas Rihanna percebeu isso e fez um óptimo disco urbano que flirta ocasionalmente com o dubstep, reggae, hip hop e EDM, evita os grandes produtores da moda e expõe um lado mais confessional e vulnerável pouco explorados em discos anteriores.
Este é o álbum de: "Diamonds", "Stay", "Pour It Up", "Right Now" e "What Now"

3º Marina and the Diamonds- Electra Heart

Se eu pudesse erguer uma estátua em reconhecimento ao que esta personagem significa na história da música contemporânea, fazia-o sem hesitação alguma. Gosto muito deste álbum e da intenção nele expressa: a criação de uma persona artística que é a perfeita antítese de tudo aquilo que Marina and the Diamonds acredita e defende, a representação do vazio moral, da corrupção humana e veículo caricatural para ilustrar quatro arquétipos femininos - "Teen Idle", "Primadonna", "Homewrecker" e "Su-Barbie-A" - explorados com mais afinco na excelente componente visual do disco dividida em 11 partes. Uma obra fundamental da pop do séc. XXI, injustamente subvalorizada e incompreendida. 
Este é o álbum de: "Primadonna", "Power and Control" e "How to be a Heartbreaker"

Fim da parte II. Continuem desse lado para descobrirem a continuação desta narrativa musical pelas minhas memórias de 2012.

Comentários

  1. Engraçado que nós temos o mesmo gosto musical! :) É raro encontrar pessoas que gostem de Everything Everything! Parabéns pelo excelente blog!

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    1. Ainda bem que encontraste o blog, então :) Gosto bastante deles, são muito intensos e visionários e não se cingem apenas às fronteiras do indie rock, sem receio de abraçar a estética R&B do qual assumem ser fãs. Tenho imensa estima pelo Arc, porque foi graças a ele que os conheci mais a fundo, mas pretendo vir ainda a explorar o Man Alive.
      São uma banda a merecer o estatuto de culto, sem dúvida.

      Obrigado pelo comentário e pelo elogio, fez-me ganhar o dia :D

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