Quem tem medo de Billie Eilish?


Durante um par de anos parecia impossível assistirmos ao nascimento de uma estrela pop capaz de superar o assombro provocado pela chegada de Lorde, em 2013, mas estamos em 2017 e tudo leva a crer que esse astro se materializa na figura de Billie Eilish, a adolescente de 15 anos que no mês passado teve direito ao seu crachá de Magnífico Material Desconhecido

A "pequena" estreia-se agora com um respeitoso EP de 8 temas a que colocou o desafiante título dont smile at me (assim mesmo estilizado) tecido na companhia do irmão de 19 anos - também ele sem qualquer crédito prévio conhecido na produção de canções - que faz The Love Club parecer uma réplica de um quadro de Cézanne.



O início demolidor de "COPYCAT" apanha-nos pelos tornozelos com a sua bassline grungy e sinistra e uma batida semi-trap que reflecte o apreço de Billie pela obra de XXXTentacion ou Tyler, The Creator. Nele, a jovem expressa o seu desagrado pela normalidade e por todos aqueles que tentam mimetizar o seu estilo ("you're italic, I'm in bold / you better love me 'cause you're just a clone"), num registo que tanto roça um sombrio grave como um etéreo agudo. Anjo e demónio. Heroína e vilã. 

Depois de nos arrastar pela lama, Billie leva-nos por uma escadaria rumo ao céu com o piano emotivo e a instrumentação suave de "idontwannabeyouanymore", misto da delicadeza de veludo de Birdy com a entrega emocional da norueguesa Aurora. O inescapável "my boy" dita ordem de marcha para um namorado desonesto e traz para cima da mesa influências de electrónica e R&B. Momento alto? O verso "alright dude, go trip over a knife". Ouuuch.



Em "watch" contempla o fim de um relacionamento tóxico numa atmosférica paleta electrónica midtempo que recaptura novamente as paisagens sonoras desenhadas por Aurora. Escutam-se afiliações folk no singelo e corrosivo "party favor", sobre esse maravilhoso presente que é terminar com alguém por voicemail... no dia do seu aniversário. 

Estas cinco amostras bastavam para fazer de dont smile at me uma das estreias do ano, mas estão ainda reservados os já aclamados "bellyache" e "ocean eyes" - e aí a escala ameaça rebentar. O primeiro, reflexo cáustico da mente de uma psicopata afligida por remorsos que carrega os cadáveres dos amigos na mala do carro, é um dos indiscutíveis temas pop do ano. O segundo, por seu lado, trata-se da apaixonante balada dreamy sobre a tentativa de reconciliação com um amor antigo, e foi para muitos a porta de entrada para o universo de Billie. Confissões em modo acústico sobre um romance doentio pairam em "hostage", que encerra o registo no mesmo tom sombrio com que teve início.



Mais umas três canções da mesma casta e Billie Eilish poderia ter assinado aqui um belíssimo disco de estreia capaz de rivalizar com Melodrama de Lorde pelo título de melhor álbum pop do ano. Estando na categoria de EP, é a melhor apresentação possível para uma jovem de apenas 15 anos - impossível não realçar isto - dona de um arrojo, maturidade e controlo artístico raras vezes observados em alguém da sua idade. Muita mas muita atenção mesmo a esta menina - Billie Eilish carrega nos ombros o futuro da pop.

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