Como foi a festa dos 30 anos da Blitz?
No dia em que o Inverno resolveu aparecer mais cedo, celebrou-se o 30º aniversário da Blitz com uma grandiosa festa no Cinema São Jorge, em Lisboa. Eu estive lá juntamente com os meus colegas de Jornalismo e Crítica Musical da ETIC na nossa primeira experiência à séria enquanto repórteres, e aqui estou no meu poiso para vos contar a minha perspectiva dos acontecimentos.
Sentado e a bater palmas - foi assim que passei grande parte da noite. Assim o quis quando me foi dada a escolher a comitiva a integrar: havia um grupo para entrevistar os artistas, outro para fazer vox pops aos anónimos, um outro encarregue de narrar a atmosfera dos diferentes espaços e um último para fazer a reportagem dos diversos concertos.
Digamos que fiquei com a parte mais "aborrecida", pois enquantos os meus colegas conheciam e estabeleciam contactos com gente ilustre como Gisela João, Rita Redshoes, Camané, D'Alva, Miguel Ângelo ou Paulo Junqueiro, estava eu encafuado no auditório do edifício a assistir a actuação atrás de actuação ao longo de 5 horas. Fossem todas as torturas iguais a esta, certo?
Primeiro assistimos às apresentações de quatro novos talentos nacionais - Valter Lobo, Elias, David Pessoa e João Caetano - todos eles cantautores com EPs já editados e com raízes na folk, rock, blues e na música tradicional portuguesa. Gostei de todos eles, mas em particular do Valter Lobo e do João Caetano. O primeiro porque tinha canções saídas da alma e directas ao coração, "tristes" como o próprio afirmou, mas tão bem compostas e interpretadas. "Eu não tenho quem me abrace neste Inverno" ou a magnífica "Pensei que fosse fácil" estiveram entre o seu reportório. O segundo porque me impressionou pela intensidade e força com que as suas canções chegaram até nós: a amplitude da voz era de tal forma que nem precisava de microfone para se fazer ouvir e achei muito curioso o facto de ter marcado a percussão inteira de um ou dois temas através do seu próprio corpo. Cheguei a arrepiar-me de tão intenso que foi. Estava concluída a primeira ronda de actuações, com a sala ainda a meio gás e à espera dos nomes da "primeira liga" que se seguiriam.
Os Capitão Fausto provocaram a primeira enchente do auditório que se acotovelava - pronto, nem tanto - para pôr os olhos em cima dos "miúdos" mais talentosos da nova vaga do rock cantado em português. Há imenso tempo que os queria ver em acção e ontem tive finalmente essa oportunidade. Deram um concerto fenomenal em que não houve espaço para os temas mais conhecidos (nem "Teresa", "Maneiras Más" ou a "Célebre Batalha de Formariz", apenas tivemos direito a "Litoral") e onde não faltaram portentosos solos de guitarra a despontar entre o céu e a terra, do manancial psicadélico da banda. Via-se que estavam ali apenas para tocar com sangue, suor e prazer e nós ali cativos à magia que emanava daqueles amplificadores. Grande banda, estupendo concerto.
Minutos depois foi altura das gerações mais antigas serem levadas ao delírio com o regresso momentâneo dos Sétima Legião aos palcos, uma das bandas portuguesas mais importantes do séc. XX. Foram os sub-40 quem mais vibrou com o reencontro, mas não pude deixar de bater o pézinho - pudera, também não tinha condições para mais - ao som das incontornáveis "Sete Mares" e " Por Quem Não Esqueci". Achei especialmente interessante a presença de Rodrigo Leão de guitarra em punho e a presença de um enorme bombo atacado com extrema precisão. De qualquer forma foi uma pequena grande lição de história condensada em poucos mas valiosos minutos.
Enquanto a plateia esvaziava a sala para acorrer (possivelmente) ao bar que eu nem cheguei a ver, subiram ao palco os Lisbon Kid, dupla que acolhe Rui da Silva e Danny de Matos, que já antes haviam dado música no pátio de acesso ao anfiteatro (diz que se chama foyer, ou treta que o valha). Estava eu à espera de um set puramente electrónico, mas a proposta da dupla ia para além da música para fazer dançar corpos. Foi uma tremenda experiência audiovisual (globos de luz e gráficos digitais a preencher o palco) com incursões experimentais e acústicas e com direito a um spoken word muito inventivo. Foram a proposta musical mais ousada e exigente da noite. Seguiu-se-lhes Flak, o guitarrista dos Rádio Macau, que também me surpreendeu pelo sólido reportório eléctrico entrecortado por investidas vocais. Gostei, mas já estava a acusar o cansaço.
A noite fechou pelas mãos sábias dos Dead Combo - a "grande supresa" que a Blitz havia prometido - a darem um concerto excepcional e imaculado, um corrido non-stop pelas maiores pérolas da sua vasta discografia que colocou todos os presentes numa hipnose profunda que poderia ter perdurado madrugada fora. A forma como Pedro Gonçalves e Tó Trips - cada um mais caricato que o outro - comunicam sem palavras ou olhares, apenas pela força da música, é fabulosa. Perfeito ponto final.
Tirando a letargia da tarefa, a bruta constipação com que estava e a frequente impassividade por estar sentado e não poder dançar como eu tanto gosto, foi uma noite magnífica. A sério, sem ironias. Tento fazer o balanço daquilo que perdi face ao que ganhei: sim, deixei a minha rede de contactos tão pateticamente vazia quanto estava e perdi a oportunidade de dizer pessoalmente à Gisela João (entre outros claro, mas ela...) o quanto a admiro, mas adquiri uma maior experiência na análise e degustação de concertos em salas (e até hoje só tinha ido a festivais) e logo para assistir a actuações de nove talentosos músicos portugueses que dificilmente teria oportunidade de ver noutros moldes.
Não esquecer o mais importante: estive presente na celebração dos 30 anos de vida da Blitz, amiga e fiel companheira de há 8 anos para cá e superei, com sucesso, o desafio que me foi proposto. Entre o que se ganha e o que se perde, há todo um conjunto de vivências que não se poderão apagar - e esta noite em particular ficará para o resto da vida.
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