Festival da Canção 2014- As canções, conjecturas e considerações

Parece que é norma falar aqui no blog do maior certame da música portuguesa promovida pela televisão pública de dois em dois anos. Fi-lo em 2010, abstive-me em 2011, voltei a ele em 2012 e no ano passado nem sequer tive oportunidade para tal porque não se realizou. Em 2014 sinto-me compelido a expressar novamente a minha opinião, não só porque manda a norma mas também porque quero.

Porquê? Perguntam vocês (ou se calhar não estão assim tão interessados e eu estou para aqui a falar with me, myself and I). Bem, não será propriamente pela qualidade do dito cujo pois essa, é sabida, de há uns anos para cá deixa muito a desejar, é mais pela estima que nutro por alguns dos concorrentes que decidiram dar a cara e a voz pelo evento na edição deste ano. 

Antes de mais, o que significa o Festival da Canção em 2014? Fazendo uma comparação um pouco absurda mas lógica, o Festival está para os portugueses como Britney Spears está para o Mundo - é uma anedota autêntica, um pálido reflexo do que foi nos seus tempos de glória. Mas, por graça divina ou interesses pouco messiânicos, ambos se movem. Porque tanto uma como o outro são imprescindíveis nesta vida, um sinal de que mudam-se os tempos e as vontades mas há coisas que perduram. E perdê-las significa acabar com uma parte de nós - do que fomos, do que sonhámos ser e do que esperamos um dia poder ainda recuperar. 

Dizem-me que as pessoas simplesmente não querem saber. Não creio que assim seja. Veja-se o exemplo do ano passado em que não houve Festival. Choveram críticas e abateram-se sob a pátria ondas imensas de indignação, como se fosse um dever cívico do país ir ao evento. Resultado: a inexistência do Festival foi mais mediatizada do que se este tivesse, de facto, acontecido. É o típico caso do oh-agora-que-foste-embora-fazes-tanta-falta-e-só-o-percebi-quando-já-era-tarde-demais. 

Eu admito. Tinha saudades do Festival. Mas ao contrário da maioria da população, e apesar de ser relativamente jovem e não me recordar dos seus anos aúreos, sempre reconheci a sua importância para o povo. Faz parte de nós tanto quanto a sardinha assada, os Pastéis de Belém ou o futebol. E, como tal, deve ser preservado e cultivado, não só na memória de todos nós, mas no dia-a-dia. E agora que passam 50 anos da sua criação, não estará já na altura do povo se reconciliar com o Festival?

Falemos agora das canções deste ano. Se chegaram até aqui, obrigado, é sinal de que até engraçam de certa forma com a minha escrita. Se por acaso deram um pulo gigante do primeiro parágrafo para este e não estavam para aturar as minhas reflexões, desculpem lá, mas há coisas que têm que ser ditas. E se não fosse agora, quando seria?

Este ano o Festival teve direito a duas fases. Ontem à noite disputou-se a semi-final, em que estiveram a concurso 10 canções e apenas 5 passaram à final, escolhidas única e exclusivamente com base no voto dos telespectadores (ui, calafrio!). Passo então a pronunciar-me acerca das eleitas:

Catarina Pereira- "Mea Culpa"

Cá vamos nós outra vez. Há 4 anos atrás foi por um triz que não foi ela a representante portuguesa - por decisão popular tinha sido, mas as contas do júri nacional baralharam o resultado final e fizeram com que fosse Filipa Azevedo a eleita. Na altura trouxe ao palco do Festival um tema intitulado "Canta por Mim" e este ano saiu-se com um... "Canta por Mim 2.0". É mais do mesmo, o que não é necessariamente mau, tendo em conta que ela teria sido uma excelente vencedora em 2010 e continuará a sê-lo em 2014. Agora que o voto do público é quem mais ordena, será que é desta?



Raquel Guerra- "Sonhos Roubados"

Fosse outra pessoa a cantar isto e tinha feito um esgar de desagrado. Mas acontece que a rapariga que a interpretou foi uma das minhas primeiras paixões televisivas em matéria de talent shows - Raquel Guerra, vice-campeã de Ídolos 2, há já 10 anos atrás. Era eu uma criança e ela uma jovem de 19 anos que poderia ter vingado na música. Tal não aconteceu e pouco mais ouvi falar dela enquanto cantora. Vê-la novamente tantos anos depois encheu-me de nostalgia e levou-me a torcer por ela, ainda que a canção não seja de trato fácil - é austera, algo bafienta e transporta-me para uma sequência de luta de Dragon Ball. Não a vejo a ganhar isto, mas foi um prazer imenso reencontrá-la.



Rui Andrade- "Ao Teu Encontro"

É a sua terceira vez no Festival - há que admirar a sua persistência - e a terceira vez que leva uma canção nos mesmos moldes. Parece-me também ser a mais fraca que já trouxe, ainda que dê uma razoável vencedora (já ouvi na Eurovisão temas da mesma linhagem). É um grande intérprete com uma voz notável, só é pena que não arranje material à sua altura.



Zana- "Nas Asas da Sorte"

Não sei de onde é que a senhora saiu, mas até que nem fez má figura. Por sorte o nome (vem de Zobaida Ana, naturalmente) não é proporcional ao talento. Não estava à espera de encontrar uma voz assim (tem ali um quê de Adelaide Ferreira) e gostei especialmente da segunda metade da canção, com aqueles poderosos arranques vocais e a junção do coro. Não dava um tostão pela senhora, mas olhem que...



Suzy- "Quero Ser Tua"

É capaz de ser o meu mínimo histórico no blog, desde que tive a infeliz ideia de num dia de abrasadora felicidade colocar um vídeo dos Santamaria por razões que ainda hoje não deslindei por completo. Não vou fazer nenhuma graçola à moça, digo apenas o seguinte: a última vez que Emanuel deixou a sua marca no Festival da Canção, a sua concorrente (na altura Sabrina, hoje Maria Teresa) acabou por vencer, isto numa edição em que também contava apenas o voto do público. Depois não digam que não vos avisei.



Alegações finais: continuamos com o mesmo problema de sempre. Óptimos intérpretes e grandes vozes, mas fracas composições e melodias sofríveis. O problema não é dos cantores, é sim dos autores - quantos mais anos levará a RTP a perceber que tem que abrir a porta a sangue novo e não insistir nos mesmos compositores da praxe? Depois, achei uma péssima ideia terem descontinuado o voto do júri especializado, é mesmo a pedirem surpresas desagradáveis (descubram qual o intruso no lote dos 5 candidatos). Por último, como é que raio não houve lugar para Ricardo Afonso nos 5 finalistas?! Fossemos nós à Dinamarca com aquela voz e saíamos de lá no top 15.

Visto que a final não trará nada de novo, suspeito que não me voltarei a pronunciar sobre o Festival. Neste momento aposto na Catarina Pereira para vencedora, se bem que acho que Zana ou Suzy (olha, podiam formar uma dupla e chamar-se Suzany) ainda podem ter uma palavra a dizer. Bem, se não ganhar a melhor, que ganhe ao menos a que tenha mais hipóteses. Até para o ano!

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