20 êxitos para celebrar o cinquentenário de Gwen Stefani
Ninguém acredita se não confirmar na certidão de nascimento, mas Gwen Stefani cumpre hoje 50 anos de vida. Ela que primeiro se notabilizou enquanto desafiante frontwoman dos No Doubt, e que mais tarde encetou num fulgorante voo a solo que já conheceu quatro álbuns de estúdio.
No seu dia especial convocamos vinte canções que atestam bem o impacto cultural e geracional de uma das vocalistas mais carismáticas e camaleónicas das últimas décadas, que desafia o tempo, concepções e etiquetas como ninguém. Feliz aniversário, querida Gwen:
20º "Push and Shove", Push and Shove (2012)- A reunião (final?) do grupo em 2012 quase que ia passando despercebida não fosse o rasgado brio de uma faixa promocional - pelos vistos demasiado arrojada - para chegar a single. Descrito pela banda como o seu "Bohemian Rhapsody", dada à sua génese esquizóide e recorte maximalista, o tema-título do seu sexto álbum pegava nos Major Lazer e em Busy Signal para uma demente infusão de ska, dub, reggae e dubstep que os devolveu aos melhores níveis criativos de Tragic Kingdom. Uggh, their minds.
19º "Make Me Like You", This Is What the Truth Feels Like (2016)- Gwen demorou a descobrir o âmago do seu terceiro álbum de estúdio, mas assim que o encontrou as canções passaram a fluir com maior naturalidade - e qualidade também. Tome-se o exemplo de "Make Me Like You", uma extasiante canção pop/disco muito na linha de "Lovefool" dos Cardigans, que expressa o seu contentamento por estar de novo apaixonada. O vídeo foi gravado ao vivo num só take e emitido em simultâneo na televisão, durante um dos intervalos da 58ª edição dos Grammy Awards. Quanta emoção!
18º "Early Winter", The Sweet Escape (2006)- Este talvez não seja o single mais estonteante do seu catálogo a solo, mas será certamente um dos mais singulares. Escrito em parceria com Tim Rice-Oxley - está explicado porque razão se parece tanto com uma música dos Keane - "Early Winter" narra o prenúncio do fim de um relacionamento numa atmosfera 80s de synthpop/new wave elegante. O vídeo conta com assinatura de Sophie Muller e com imagens captadas em Budapeste, Milão ou Praga - très très européen.
17º "Underneath It All", Rock Steady (2001)- Os últimos singles antes da primeira paragem da banda foram realmente bons. Lançado como 3º avanço de Rock Steady e com uma produção reggae fabulosa da lendária dupla jamaicana Sly and Robbie, "Underneath It All" é uma adorável declaração de amor ao então namorado Gavin Rossdale e à história de superação que atravessaram. Não só foi o single da banda que mais longe chegou na tabela de singles norte-americana (nº3), como ainda lhes concedeu o seu segundo Grammy consecutivo na categoria de Melhor Performance Pop por um Duo ou Grupo.
16º "Luxurious", Love. Angel. Music. Baby (2004)- Cha-chiiiiing! O ano era 2005 e Stefani estava numa maré de sucesso que só haveria de acalmar a partir do single nº5 da bem-sucedida e multifacetada estreia a solo. Menos sobre ostentação e opulência do que aparenta, "Luxurious" versa sobre prosperidade no amor em cama de R&B sensualão, apoiando-se fortemente no sample do tema "Between the Sheets" (1983) dos Isley Brothers. Os interlúdios em francês são cortesia do marido.
15º "Hey Baby", Rock Steady (2001)- Começava aqui a bem-sucedida era de Rock Steady. Desenhando inspiração nas inúmeras festas pós-concerto da digressão de Return of Saturn e nas próprias que ocorreram durante a gravação deste seu quinto álbum na Jamaica, "Hey Baby" tenta perpetuar esse clima de deboche com uma pegadiça composição dancehall de novo com assinatura da dupla Sly and Robbie e direito a toast certificado de Bounty Killer.
14º "Wind It Up", The Sweet Escape (2006)- Yodellay, yodellay, yodel-low! Isto é Gwen na sua versão mais insana e excêntrica, com um single talvez um bocadinho à frente do seu tempo que a crítica não hesitou em chacinar. Criada originalmente para um desfile da sua linha de roupa, "Wind It Up" acabou por encontrar o seu caminho para o segundo disco em nome próprio, revestindo-se de uma bizarra produção electro-hop dos Neptunes de Pharrell, que inclui secções em tirolês e uma interpolação de "The Lonely Goatherd" de Música no Coração, cuja inspiração extravasa para o vídeo.
13º "Sunday Morning", Tragic Kingdom (1995)- Entramos na icónica era de Tragic Kingdom ao som de "Sunday Morning", uma estupenda e rancorosa amostra ska punk/reggae rock liricamente inspirada no término do relacionamento de Stefani com o baixista Tony Kanal que, ironia das ironias, ainda a ajudou a escrever a canção. O vídeo de Sophie Muller testemunha não só a cumplicidade entre ambos como a harmonia entre a banda - apenas um dia normal em Anaheim que culmina com uma batalha campal de arremesso de comida.
12º "Used to Love You", This Is What the Truth Feels Like (2016)- Aqui está um belo exemplo de como estragar uma canção com tremendo potencial com um vídeo decepcionante - e logo Gwen, que sempre se pautou por vídeos formidáveis. Balada synthpop emocional que brota do final turbulento do seu casamento com Gavin Rossdale, "Used to Love You" devolveu-a à rota certa após um par de singles duvidosos - "Baby Don't Lie" e "Spark the Fire" dizem olá - mas perdeu fulgor assim que o decidiu ilustrar com um conceito minimalista que assenta num acting pouco credível.
11º "Spiderwebs", Tragic Kingdom (1995)- Tema de abertura e segundo single de Tragic Kingdom, "Spiderwebs" é uma imensa canção new wave/pop punk que manda bugiar um pretendente que lhe liga a recitar poesia francamente má - um clássico que só poderia ser puramente 90s, tendo em conta o método ancião de engate. O vídeo faz bom uso da lente-olho-de-peixe e da ideia constrictora dos cabos telefónicos.
10º "Rich Girl", Love. Angel. Music. Baby (2004)- Na-na-na-na-na-naa. Ahh, como esquecer a aventura pirata de Gwen a meio da década passada? O ano era 2005 e o 2º single do debute a solo navegava nos altos mares de uma produção reggae-pop cortesia de Dr. Dre, que na verdade é um remake do tema com o mesmo nome de 1993 da dupla Louchie Lou & Michie One, também ele adaptado de "If I Were a Rich Man" do musical Um Violino no Telhado. Aqui, Gwen canaliza os seus sonhos de riqueza e luxo enquanto criança, repetindo a dupla com Eve, que já lhe havia proporcionado bons resultados com "Let Me Blow Ya Mind", quatro anos antes.
9º "4 in the Morning", The Sweet Escape (2006)- Há algo de tremendamente belo quando Gwen Stefani se entrega a baladas vulneráveis, excepcionalmente bem produzidas. "4 in the Morning" caminha nesse espectro: uma cintilante composição synthpop/new wave midtempo com ecos de Madonna dos anos 80 ou dos Tears for Fears, escrita com Tony Kanal (fantástica a ligação que mantêm) acerca de uma relação à beira do precipício, que Gwen tenta desesperadamente salvar. Por si só quase que justifica a era inteira de The Sweet Escape, apesar de não ter sido bem-sucedida por aí além.
8º "The Sweet Escape", The Sweet Escape (2006)- Ora, o tema anterior recebia uma pesada herança deste senhor, garantidamente um dos singles mais populares e inescapáveis de 2007. A escolha de Akon para a cadeira de produtor pode ter sido duvidosa - principalmente quando agracia o feature apenas com inúmeros wooo-hooo's e yeeee-hooo's - mas o autor de "Lonely" acabou acertadamente por devolver elementos dos No Doubt à obra a solo da sua vocalista, impregnando "The Sweet Escape" de aromas ska e doo-wop. Muita estima pelo conto moderno da Rapunzel no respectivo vídeo.
7º "Hella Good", Rock Steady (2001)- Dezassete anos volvidos, isto ainda é um abuso de single. A noção de ruptura e transgressão está bem patente nesta acesa produção funk rock com elementos electro e dance-punk de Nellee Hooper que envolve também Chad Hugo e Pharrell dos Neptunes. "Hella Good" é no fundo uma canção celebratória sobre aspectos positivos da vida de Gwen, mas é entregue com tamanha verve e atitude, que podia também incitar um motim descontrolado. Ooh yeaahh yeaaah!
6º "It's My Life", The Singles 1992-2003 (2003)- Wow, a criatividade de Gwen estava no auge por esta época, não admirando por isso que se tenha aventurado a solo. Antes, porém, celebrava uma década de êxitos com os seus companheiros de sempre através de uma retrospectiva de carreira liderada pelo inédito "It's My Life", que é na verdade um cover do êxito new wave/synthpop com o mesmo nome dos Talk Talk de 1984. O vídeo de David LaChapelle é uma teia de crime e loucura, que revela as melhores qualidades interpretativas de Stefani. Uma despedida de arromba.
5º "Hollaback Girl", Love. Angel. Music. Baby (2004)- Vamos lá, todos em uníssono: this sh*t is bananas, B-A-N-A-N-A-S! Recuamos ao tempo em que Gwen, do alto dos seus 35 anos, voltou ao secundário, envergou um fato de cheerleader, e foi simplesmente a rainha do mundo. Sob uma icónica produção dos The Neptunes que inclui apenas uma drum machine, um riff insular e uma secção de metais, "Hollaback Girl" tornou-se no maior êxito a solo da carreira de Stefani, e um marco absoluto na cultura pop dos anos 00. Absurdamente disparatado, mas incontornável.
4º "What You Waiting For?", Love. Angel. Music. Baby (2004)- Tick tock, tick tock, tick tock. Depois de uma década de sucesso nos No Doubt, Gwen lançava-se aos 34 anos numa carreira a solo, idade em que muitas das suas congéneres começam a definhar criativa e comercialmente. Cabia a Stefani reescrever as regras: "What You Waiting For?" fê-la sair de um bloqueio artístico, perder os receios de aventurar-se sem os seus companheiros, justificando o propósito deste seu novo e entusiasmante fôlego. Nunca esqueceremos o brilhante vídeo de Francis Lawrence inspirado em Alice no País das Maravilhas, a verve electropop/new wave do tema, as míticas Harajuku Girls aqui introduzidas, e a coragem que lhe foi necessária. Bendito risco.
3º "Just a Girl", Tragic Kingdom (1995)- Após dois álbuns sem expressão comercial - o homónimo de estreia em 1992 e The Beacon Street Collection, três anos mais tarde - os No Doubt tinham tudo a provar à terceira tentativa. Assumindo os comandos da escrita como até aqui ainda não havia feito, Gwen despejou para o papel a sua frustração perante a condição feminina, num mundo dominado pelo patriarcado e pela falta de igualdade de género: nasce um gigantesco single new wave em tom de sátira comandado por uma desafiante interpretação, que lhes escancararia por fim as portas do mainstream.
2º "Don't Speak", Tragic Kingdom (1995)- E depois de "Just a Girl", havia um imenso "Don't Speak" à espreita que atirou a banda para níveis galácticos. Originalmente concebida enquanto uma canção de amor em linhas mais jazz e groovy, mudou drasticamente de conceito assim que a relação de sete anos entre Gwen e Tony Kanal chegou ao fim, transformando-se numa dolorosa canção de desvinculação amorosa. É um clássico intemporal e absoluto da década de 90 que cimentou de vez a marca dos No Doubt e que continua a permitir a descoberta da banda pelas novas gerações.
1º "Cool", Love. Angel. Music. Baby (2004)- Em algum momento pensámos que seria possível para Gwen superar o colosso emocional de "Don't Speak"? Não, até "Cool" ter chegado e encerrado um ciclo iniciado por esse mesmo tema: novamente a abordar o término da sua relação com Tony Kanal e a forma como o superaram, conservando a amizade que os unia e nutrindo felicidade pela estabilidade dos seus actuais relacionamentos (não é por acaso que a actriz do vídeo é na vida real a parceira de Tony). Dallas Austin e Nellee Hooper entregam-nos a canção em pristinos moldes synthpop/new wave com heranças dos anos 80, mas é o belíssimo vídeo de Sophie Muller - gravado no paradisíaco Lago de Como, em Itália - que torna tudo tão mais arrebatador, revelando o esplendor de Gwen enquanto mulher e intérprete apaixonante. Que sonho lindo.
Mais do que qualquer canção consiga descrever, o percurso de Gwen Stefani deve-se principalmente a três factores: coragem, risco e inovação. Era difícil singrar enquanto rapariga numa banda de homens a fazer música ska, punk e new wave - mas ela conseguiu. E era igualmente difícil deixar uma marca a solo no panorama pop com quase o dobro da idade das suas adversárias e o triplo das consequências nefastas - mas ela conseguiu. E a vida recompensou-a sempre.
Felizes de nós por termos alguém como ela nos nossos imaginários e corações. Parabéns, Gwen - que as canções e o sentido de viver e criar arte nunca se acabem.
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