As 250 Melhores Canções Internacionais da Década: 250º-226º
Começamos a escalar a montanha com a contagem das primeiras vinte e cinco canções:
250º Delphic- "Doubt" (2010)- Não há nem sinal de vida deste trio britânico no fecho da década, mas não nos podemos esquecer de que quando esta gatinhava, os Delphic apontavam para um entusiasmante presente com a sua fusão de electrónica com guitarras - nos passos dos New Order ou dos Klaxons - da qual "Doubt" será o melhor exemplo. Sobra um inquietante single construído sobre as intermitências do coração, com uma descarga suprema por volta do minuto três.
249º Hamilton Leithauser & Rostam- "A 1000 Times" (2016)- Foi a meio da década que Mr. Leithauser fechou a actividade dos The Walkmen para balanço, mas logo de seguida inaugurou uma carreira a solo que conheceu expoente com o disco colaborativo de 2016 com o ex-Vampire Weekend Rostam, que lhe tece em "A 1000 Times" uma produção intemporal, quase encantatória, para receber a expressão de angústia evocada por um amor não correspondido.
248º Sade- "Soldier of Love" (2010)- Sade Adu escolhe tão poucas ocasiões para nos agraciar com a sua arte, que cada aparição é uma benção. Logo na aurora da década, e dez anos volvidos de Lovers Rock, Sade e a sua fiel armada recordavam-nos que o amor é um campo de guerra - e só os mais fortes e temerários resistem. A atmosférica e marcial produção trip hop/soul foi trazida à vida com uma sumptuosa ilustração de Sophie Muller. Continência à Rainha do Amor.
247º Chance the Rapper feat. 2 Chainz & Lil Wayne- "No Problem" (2016)- A influência de Kanye é forte nesta, ainda que o seu nome não se vislumbre sequer nos créditos. "No Problem" soa a uma valente feel-good song com a sua proposta de gospel rap, apesar de ser na verdade um intimidante recado a todas as editoras que se atravessam no caminho de Chance ("if one more label try to stop me, it's gon' be some dreadhead niggas in ya lobby"). Será quanto muito uma celebração da sua independência - cinco mixtapes e um longa-duração depois, ainda não vergou.
246º Janelle Monáe- "Tightrope" (2010)- O primeiro contacto com Janelle Monáe foi tudo menos banal. De volta ao tempo em que nos apresentou um monumental disco de estreia com The ArchAndroid (2010), ópera de afrofuturismo e ficção científica levada a cabo pela persona de Cyndi Mayweather, em "Tightrope" - sobre manter a postura e os pés assentes no chão quer em tempos de glória ou tempestade - irrompe num jogo de pés febril à la James Brown e encarna a tradição soul/funk do último fôlego dos Outkast. A singularidade e genialidade já tão bem vincada.
245º Wild Beasts- "Wanderlust" (2014)- Existe um antes e um depois desta canção na vida dos extintos Wild Beasts. A androginia e a atmosfera dreamy dos três primeiros álbuns dá lugar a uma versão mais acesa, incisiva e sintetizada do quarteto britânico que tem início com este cartão de visita do seu quarto disco, Present Tense (2014), num agitado diálogo entre bateria e sintetizadores e de censura nítida dos falsos criadores e usurpadores de arte. Boa corrida, rapazes - descansem em paz.
244º Zhu- "Faded" (2014)- Há qualquer coisa de intrínseco à dita música de dança que nos faz sucumbir às mais primitivas emoções. Escuta-se "Faded" - pecaminoso pedaço de future house do então estreante e ainda anónimo produtor norte-americano Zhu - e é difícil resistir à tentação de nos aventurarmos nas profundezas de um sofisticado clube underground e impedir que façamos coisas muito muito impróprias. Não importa quem é a presa e quem é o caçador - o prazer é sempre nosso.
243º The Weeknd feat. Daft Punk- "I Feel It Coming" (2016)- As colaborações dos Daft Punk em Starboy (2016) eram tão formidáveis que foram imediatamente lançadas como primeiro e segundo singles do registo. Munido de um delicioso balanço disco-pop/house, "I Feel It Coming" presta tributo à era de Off the Wall de Michael Jackson, funcionando como uma espécie de versão mais diluída de "Get Lucky". Aqui, Abel Tesfaye, assumido bandido do coração, está preparado para lidar de frente com as consequências de um sério compromisso.
242º Lizzo- "Boys" (2018)- Não se descuidem: a lenda de Lizzo está apenas a começar. Na década em que a vimos nascer, nem "Truth Hurts", "Good as Hell" ou "Juice" se assumem como pilar central da sua criação. A justificativa está sobretudo em "Boys, estonteante construção funk-pop de recorte retro e uma linha de baixo insana, que se assume como uma celebração não só da sua prolífica vida amorosa, como dos rapazes de todos os tamanhos e feitios.
241º Glass Animals- "Hazey" (2014)- Da maravilhosa e estranha selva sónica que é Zaba (2014), "Hazey" será porventura a criatura mais fascinante: uma tão obscura quanto exótica produção que inclui percussão tropical, electrónica groovy, guitarras indie, um xilofone (!) e a vocalização suada e dreamy de Dave Bayley, a versar acerca da relação entre um pequeno rapaz e o seu pai alcoólico abusivo.
240º Ella Eyre- "Deeper" (2013)- Vamos acreditar que o inusitado cameo de Fátima Lopes no vídeo em nada influencia o julgamento, mas "Deeper" continua a ser um bestial single de estreia. Alicerçado numa impecável produção neo soul/breakbeat de Two Inch Punch, introduz com brio a voz estonteante e de indomável diva soul de Ella Eyre, aqui a justificar a recusa de um pretendente que lhe disse aquelas duas palavras proibidas.
239º Alex Clare- "Too Close" (2011)- No início da década o mainstream despertava para o dubstep, com Skrillex na dianteira e Britney Spears ou Rihanna a trazer influências do género para a América, e nomes como Magnetic Man, Chase & Status ou Katy B a erguer bem alto a bandeira no Reino Unido. E depois tínhamos alguém como Alex Clare a fundir electrónica, rock e soul com uma trepidante canção cozinhada por Diplo, Switch e Ariel Rechtshaid que só conheceu aclamação popular depois de ter musicado um anúncio da Internet Explorer, no ano seguinte.
238º Rita Ora- "Anywhere" (2017)- Depois de tantas hesitações e singles medíocres, chegámos todos a um ponto em que quase desistimos de Rita Ora, outrora a maior estrela pop feminina dos anos 10 que o Reino Unido daria ao mundo. Mas depois 2017 aconteceu. Sobretudo, "Anywhere" aconteceu. Rita era de novo um astro imparável, mas foi este estupendo single assinado por Alesso, Watt e Sir Nolan que nos devolveu a fé em si: uma deslumbrante construção electropop sobre escapar à rotina na companhia da pessoa amada. Dificilmente fará outra igual.
237º The National- "Bloodbuzz Ohio" (2010)- Matt Berninger e companhia têm aquela particularidade de nos arrastar para a tristeza e desalento que (tão bem) cantam. O ponto alto da consternação nesta década chegou por via do inesquecível cartão-de-visita de High Violet (2010): uma missiva de amor e desânimo para com a Ohio natal, ou a soturna constatação de alguém que se vê afundado nos seus próprios demónios e dívidas.
236º Haim- "If I Could Change Your Mind" (2014)- A estreia em disco das manas Haim tem tantos momentos encantadores, mas nenhum deles revela tão bem as suas inclinações e ambições pop como o funk rock castiço de "If I Could Change Your Mind", que tem as heranças dos Fleetwood Mac com toda uma Whitney Houston via 80's dentro. E se dúvidas houvesse de que há uma girlsband credível pronta a libertar-se de Este, Alana e Danielle, este vídeo maravilhoso trata de as dissipar.
235º Shift K3Y- "I Know" (2014)- Lewis Jankel aka Shift K3Y é um músico de vastos recursos capaz de escrever, produzir e interpretar as suas próprias canções. E se não existe grande ciência em compôr uma canção de engate como "I Know", há competência envolvida na quantidade de BPMs utilizados e na mistura correcta dos seus elementos. Mais ainda, há muito de Justin Timberlake do tempo dos NSYNC nesta sua aditiva vocalização. No final do dia, "I Know" é só uma canção deep house formidável.
234º Katy B- "Crying for No Reason" (2014)- Muito antes da saúde mental ser debatida no mainstream, já Katy B mencionava episódios de tristeza súbita e insondável confessados através de uma canção. Katy fê-lo de forma notável com o segundo single de Little Red (2014) - momento de rutura no seu catálogo até então mais orientado para a música de dança - uma magnífica e ampla balada breakstep assente nas fundações de "Flashdance... What a Feeling", e que proporciona à sua intérprete uma tour-de-force vocal emocionante.
233º Solange- "Cranes in the Sky" (2016)- A Knowles mais nova esteve oito anos sem editar um longa-duração, apesar de ter lançado uns quantos singles pelo meio, e a transformação foi notória - "Cranes in the Sky" baseia-se numa belíssima construção orquestral de Raphael Saadiq com bateria e baixo discretos à mistura, em que Solange confessa as suas vãs tentativas de afastar uma dor profunda que insiste em não processar. O belíssimo vídeo assinado em parceria com o marido Alan Ferguson elevou tudo a um estado de consciência superior.
232º Rhye- "Open" (2012)- Como esquecer o mistério tentador que os Rhye foram na primeira metade da década? Conduzidos pela vocalização andrógina e quase murmurante de Milosh ancorada em heranças de Sade, e abençoados pelas sensibilidades soul/R&B downtempo de Robin Hannibal, produziram alguma da música mais sedutora e romântica dos anos 10, pontificada por "Open", sobre querer fazer perdurar a ligação afectiva num momento de intimidade. Hmmmmmh.
231º Ryn Weaver- "The Fool" (2015)- Não vamos chorar pelo que Ryn Weaver poderia ter sido, vamos antes aclamá-la por aquilo que o seu breve contacto com o mainstream foi. Uns dirão que "OctaHate" terá sido o seu pináculo, mas é "The Fool" que desbloqueia todo o seu potencial: uma esquisita, trepidante e extraordinária canção sobre arruinar tudo no jogo do amor, pontuada pela sua interpretação excêntrica. Mas é no minuto final que se abre um portal para outra dimensão, quando a canção explode num projéctil de luz supersónico, cortesia do homem forte dos Passion Pit. Incrível.
230º Clean Bandit feat. Sean Paul & Anne-Marie- "Rockabye" (2016)- O que fazem um grupo de electrónica com background orquestral, o embaixador do dancehall no mundo e a então nova coqueluche da pop britânica juntos? O supremo bop emocional. "Rockabye" seria sempre um hit de grandes proporções, dado o seu tempero dancehall/electrónico irrecusável e os talentos dos nomes envolvidos, mas por trás existe uma sonante mensagem de encorajamento e solidariedade às vidas de todas as mães solteiras que lutam arduamente para criar os filhos. É obra.
229º Unknown Mortal Orchestra- "Can't Keep Checking My Phone" (2015)- O ano era 2015 e os UMO erguiam todo um álbum em torno da experiência poliamorosa que o vocalista Ruban Nielson e a sua esposa mantiveram durante um certo período de tempo com uma terceira pessoa. Nenhuma das suas faixas é tão ubíqua ou convidativa quanto a ginga disco-funk/indie pop de "Can't Keep Checking My Phone", crónica para a ansiedade acentuada pela distância - e que acaba por espelhar também um dos piores flagelos modernos da sociedade.
228º Neon Indian- "Annie" (2015)- Por esta altura já o projecto de Alan Palomo tinha evoluído para lá do rótulo da chillwave em fantásticas e entusiasmantes novas direcções: no primeiro avanço de Vega Intl. Night School (2015), ouviamo-lo numa busca incessante por uma tal "Annie" até o sol se pôr, num irresistível balanço disco/neo-psicadélico que cruza Ace of Base, Duran Duran ou Animal Collective. O Verão'15 passou totalmente por aqui.
227º Dagny- "Backbeat" (2016)- Diz-se que das grandes canções pop não são precisos mais do que cinco segundos para as reconhecermos como tal. Assim é com "Backbeat", que nos prende logo com a sua corrente de oh-oh-oh's, tem-nos a seus pés com a encantatória melodia vocal de Dagny e a bateria acentuada, e levanta-nos do chão com uma interpretação imensa, repleta de carisma, à boa moda de Natasha Bedingfield. Bendita precisão norueguesa.
226º Neon Trees- "Animal" (2010)- É difícil perder o rasto a uma banda que tem um arranque tão fortíssimo quanto os Neon Trees. "Animal" tinha tudo: verve alt rock com nervo dance-punk, uma interpretação incendiária e maior-que-a-vida conferida pelo carismático Tyler Glenn, versos que documentam a nervosa transição de amizade em amor, e uma valente dimensão pop que lhes conferiu bastante visibilidade mediática. Só poderia dar certo.
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