REVIEW: Ella Eyre- Feline


Estreia em disco tardia para uma das promessas maiores de 2014 cumpre à risca as expectativas, mas castra as hipóteses de projecção da sua autora. 

Ela vinha à boleia de um infalível "Waiting All Night" na armada dos Rudimental e com a medalha de prata ao peito na corrida dos novos talentos para 2014 segundo a BBC, apenas suplantada por Sam Smith. Tinha até um EP catita no bolso e a garantia da edição do álbum de estreia nesse ano, mas quando o desempenho dos singles lançados não correspondeu às directrizes da sua editora, a ordem foi esperar e aguardar pelo momento indicado.

A "máquina" da indústria, aquela mesma capaz de erguer em tempos recentes fenómenos como Sam Smith, Years & Years ou James Bay, não foi capaz de sustentar o hype em torno de Ella Eyre. Queriam um nº1, quando ela com esforço chegava ao top 20. Esperavam uma maior abertura do mercado para a receber, mas a indústria britânica estava em força para projectar talentos masculinos (Smith, Ed Sheeran, Hozier ou George Ezra). E o tempo de Ella passou.



Os singles foram-se tornando menos interessantes a cada nova tentativa, o ânimo relativamente ao disco esmoreceu e a sua duração nas tabelas e nos ouvidos dos consumidores esgota-se ao ritmo de um fósforo a arder. Ela é só a vítima mais recente, mas o problema é profundo - até quando se desviará o debate do livre acesso à música para o controlo que as editoras têm sobre os seus artistas?

Ella Eyre é facilmente a voz britânica mais inconfundível a despontar no panorama musical desde Amy Winehouse e Adele, movimenta-se num ginasticado circuito de pop, R&B, neo soul, drum and bass e breakbeat e, como se não bastasse, tem uma imagem e personalidade cativantes que tanto ajudam à construção de uma identidade reconhecida. Em Feline é comum as canções não terem fôlego para acompanhar a garra da sua intérprete: há demasiados produtores envolvidos, hiperactividade sónica que resulta em inconsistência e uma certa letargia lírica que se explica pela curta experiência de vida da sua autora (Ella teria entre 19-20 anos quando escreveu os temas do álbum).



No campo do drum and bass jogam os esfuziantes "Together", "Good Times" e os desnecessários "Gravity" e "Always"; como exemplares de neo soul encontramos um inescapável "Deeper" arrancado ao seu EP de estreia, a dura compreensão de que as coisas na primeira pessoa do plural não darão certo em "Two", o egocentrismo do parceiro em "All About You" ou um "Typical Me" decalcado da produção percussiva de Ryan Tedder. Para a galeria dos mais mortiços têm entrada directa "Home" (estranho hino ao conforto do lar) e uma tentativa falhada de afinidade solitária em "Alone Too".

Três momentos muito bons? Há-os em "Even If", a balada que poderia perfeitamente ter escapado a In the Lonely Hour e que funcionará às mil maravilhas como single outonal, nas interrogações amorosas de "If I Go", brilhante na conjugação de pop, R&B e breakbeat, e nas promessas de retaliação contra os destroços do coração provocados pela ala masculina no gigantesco "Comeback", a evocar as juras vingativas de uma Kelly Clarkson pré-matrimónio ("we've all been played, we all get hurt/ just take that pain and let that motherfucker burn"), porventura o momento mais pop e desafiante do disco.

O potencial de crescimento de Ella Eyre é enorme e certamente será capaz de um álbum mais coeso e interessante numa próxima tentativa, mas se há lição que se pode retirar deste Feline é como a pressão executiva pode arruinar um disco de estreia e as hipóteses de projecção da sua autora logo à primeira oportunidade. 



Classificação: 7,2/10

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