REVIEW: Hurts- Surrender
Adeus tristeza, até depois. Os Hurts de Surrender são garridos, não raras vezes extasiantes e inquietantemente banais.
Não é preciso chegarmos sequer à audição do disco para percebermos que Theo Hutchcraft e Adam Anderson estão diferentes. O título indica entrega, rendição a algo e um observador atento não deixará escapar que esta é a primeira capa não monocromática do catálogo da dupla britânica.
Os dois títulos anteriores fizeram-se de um celebrado negrume synthpop/new wave algures entre Depeche Mode e o romantismo dos Spandau Ballet, e este novo indica uma aproximação aos trópicos, ao calor de Ibiza e a estados de alma mais risonhos. Não surgem completamente descaracterizados porque mantém-se a produção cuidada e as linhas vocais robustas e indissociavelmente Hurts, mas é uma mudança de ares capaz de não ser bem recebida por todos.
"Some Kind of Heaven" nem é um mau cartão de visita desta nova condição expansiva da dupla, reunindo as suas influências orquestrais e sintetizadas numa amálgama de velozes bpm, com um breakdown percussivo a piscar o olho aos OneRepublic. Estranha-se mas entranha-se. "Why", apesar de identificável com esforços de uma boysband, também se tolera graças ao refrão aditivo. Menos fácil de engolir será "Nothing Will Be Bigger Than Us", a não ser que se seja fã de "Under Control", a colaboração dos ingleses com Calvin Harris - e aí será a melhor coisa que encontrarão no alinhamento. Um portentoso banger electro house.
"Kaleidoscope" vê-os a embarcar no revivalismo disco da presente década, mas apesar de eficaz soa algo constrangedor e sensaborão. "Rolling Stone" conserva o dramatismo e a tensão dos primórdios, mas quase que pede para ser detestada graças a decisões de produção sofríveis. Pior, só mesmo "Wings", francamente terrível a nível da letra e melodia e a envergonhar uma dupla que começa a apresentar pouco tacto e faro criativo.
De volta ao melhor lado de Surrender encontramos o doce veneno de "Slow", que certamente perdeu o convite para integrar a banda sonora de Fifty Shades of Grey, o fogo lento do divinal "Lights" em combustão disco e "Wish", mesmo a fechar o álbum, a faixa que nos assegura que os Hurts ainda não se esqueceram de como fazer uma óptima balada, ainda que uns furos abaixos de "Stay" ou "Blind" - a prosa ficcionada, o lamento do piano e o delicado falsete de Theo relembram-nos a dupla a quem jurámos devoção por altura da estreia.
33 minutos e 10 temas depois, não há grandes razões para voltarmos a clicar no play. Surrender tem os seus bons momentos, mas falha como obra capaz de suportar a renovada visão da banda - demasiado caloroso para a época outonal em que é lançado e disruptivo para com o seu passado. Três álbuns no currículo e a qualidade continua a descer, mas é cedo ainda para desistir da dupla. Antes terá ela que desistir de si própria, o que claramente ainda não aconteceu. Por agora, o óbvio: os Hurts são bons é a sofrer.
Classificação: 6,7/10
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