REVIEW: Carly Rae Jepsen- Emotion


Nada indicava que o fizesse, mas Carly Rae Jepsen assina o melhor álbum pop de 2015. Confirma-se: é fenomenal.

Percurso curioso, o desta rapariga. Terceira classificada na versão canadiana de Ídolos em 2007, lança um primeiro álbum com selo independente no ano seguinte sem qualquer expressão comercial. Quatro mais tarde, aos 26 de idade, encontra o sucesso mundial quase por acidente quando Justin Bieber se lembra de tweetar à sua legião de fãs acerca de "Call Me Maybe" - bubblegum pop da melhor lavra de "Baby One More Time" ou "Genie In a Bottle" - e de se gravar a fazer playback da canção num vídeo que rapidamente se tornou viral e inspirou milhares de outros.

Com o apoio do manager de Bieber, Carly Rae Jepsen assinava pela sua Schoolboy Records e pela major Interscope. Num ápice, "Call Me Maybe" estourava por todo o lado e tornava-se no maior hit do Verão de 2012. Kiss, o primeiro lançamento internacional de Jepsen, conhecia edição em Setembro desse ano mas nunca conseguiu capitalizar o sucesso proporcionado pelo inescapável 1º single. Tudo parecia evidente: estava condenada a ser só mais uma one-hit-wonder. Pelo menos nas nossas cabeças, na dela não.



Um terceiro álbum cedo começou a ser esquematizado com grandes nomes a bordo - de Max Martin, Benny Blanco a Shellback - até Carly assumir controlo criativo e assegurar que não regressava enquanto não tivesse um corpo sólido de canções tão fortes ou melhores que "Call Me Maybe". Indicam os relatos que foram necessárias 250 tentativas para que chegasse ao resultado pretendido e Emotion ganhasse forma. Ele acabaria por chegar muito depois do inicialmente previsto: primeiro ao Japão, em Junho passado, e ao resto do mundo em Agosto.

De facto, o título de one-hit-wonder ainda não a abandonou e a nível comercial o novo disco foi um desastre tão grande ou maior que o anterior. A proeza está na forma como o registo tem garantido presença nas listas de melhores discos do ano. Terá a Interscope subornado meia imprensa para tal acontecer ou - permissão para a pulsação aumentar - estamos mesmo perante um álbum essencial de 2015?

Taquicardias ao alto, o raio do disco é bom. Muito bom, aliás. A temática é simples - amor, paixões assolapadas, desgostos - que ouvimos vezes sem conta em discos de outras contemporâneas suas. A diferença substancial está na forma como são servidas: em inteligentes e certeiras decisões estilísticas que recapturam as melhores produções pop dos anos 80, numa abordagem semelhante se não superior à de Taylor Swift em 1989. Mas com elevado grau de doçura, euforia pura e positivismo, quer na alegria, quer na tristeza.



Há um excelente "Run Away With Me" à cabeceira que dá o mote ao resto do álbum. Treme de entusiasmo, exulta vida e recaptura na perfeição a sensação de ser jovem e estar apaixonado - é a sequela de "Teenage Dream" que não sabíamos que precisávamos e o verdadeiro hit de Verão que merecíamos ter tido. E aquele saxofone a ecoar intermitentemente, como borboletas no estômago que vão e vêm, é absolutamente fantástico.

Depois disso são pérolas atrás de pérolas: desde a candura pop tão-Britney-encantada-pelos-80s do tema-título; a efervescência de "I Really Like You" (quando um single imediato destes não pega, a campanha promocional está condenada ao fracasso); a exasperação romântica de "Gimmie Love"; ao socorro indesejado mas atencioso de "Making the Most of the Night", número funk pop acelerado sobre sequestrar um amigo e obrigá-lo a ver a beleza das luzes da cidade no banco de trás do carro de forma a curar o seu desgosto romântico; passando pelas bem-sucedidas investidas disco pop de "Boy Problems" (Katy Perry não desdenharia) e de um esperançoso "Let's Get Lost" (olá de novo, saxofone) no encalço de "Fantasy" de Mariah Carey; até à recordação da Lady Gaga da era The Fame no extravagante "LA Hallucinations".



Fortes na recordação dos anos 80 estão a emocionante balada sintetizada "Your Type" (o seu equivalente a "Style" de Taylor Swift), o único momento em que o desgosto ameaça tapar o sol que há em Carly, e "When I Needed You", a descoberta ou a recuperação do amor próprio pós-desilusão amorosa ("I know that I won't change for you / cause where were you for me? / when I needed someone? / when I needed you?). Os dois temas mais expeditos, porém, pertencem à sofisticação post-disco do vaporoso "Warm Blood" com Rostam Batmanglij (Vampire Weekend) ao comando dos botões e à sedutora vulnerabilidade presente em "All That", synthpop em combustão lenta para dançar agarradinho à luz da bola de espelhos, com o cunho de qualidade da dupla Dev Hynes/Ariel Rechtshaid.

Porque razão Emotion não nasceu também para a aclamação do público? Aparentemente, Carly Rae Jepsen é um produto fora de validade: recém-chegada aos 30 e com um pico comercial já estabelecido, parece ser mais fácil para a indústria catalogá-la como uma one-hit-wonder em que já não é rentável apostar. Teria sido tão mais fácil para ela replicar "Call Me Maybe" à exaustão, mas em vez disso fez um excelente disco do qual se pode orgulhar e que ficará conhecido como o gémeo negligenciado de 1989. Glória a Jepsen, irmãos da causa pop.



Classificação: 8,3/10

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