As 250 Melhores Canções Internacionais da Década: 100º-76º
100º Hurts- "Wonderful Life" (2010)- Tudo começa num Sábado à noite, quando Susie conhece o homem dos seus sonhos na ponte de Severn. Ele diz-lhe que se meteu em sarilhos e que, se ela não se importar, prefere estar sozinho. O que se desenrola a seguir é uma missão anti-suicida, com Susie a argumentar que há muito mais que a vida lhe pode oferecer, agarrando-se à esperança de que aquele amor à primeira vista subsista. Os Hurts a excederem-se no campeonato do melodrama pop ao serviço de uma imaculada produção synthpop, entre Pet Shop Boys e Spandau Ballet. Never give up.
99º Beyoncé- "Formation" (2016)- Todos nos lembramos do dia em que Beyoncé proclamou orgulho racial e nos deu a mãe de todos os hinos da feminilidade negra, ilustrando-o com um dos vídeos mais icónicos da década. "Formation", uma caótica construção trap/bounce de Mike Will Made It, é o momento em que Queen B cancela a agenda pessoal e se torna política e socialmente activa, rugindo em prol do movimento Black Lives Matter e das suas heranças enquanto afro-americana com raízes no Louisiana e no Alabama. Slay trick or you get eliminated.
98º Khalid & Normani- "Love Lies" (2018)- Esta canção capta um momento muito bonito na carreira dos dois, sendo capaz de confirmar Khalid como um dos mais notáveis intérpretes R&B da sua geração, ao mesmo tempo que fazia crescer a estrela de Normani, aqui na sua primeira aparição a solo. Importa salientar também a maturidade - ambos não tinham mais que vinte anos - com que se entregam a uma canção tão densa e íntima quanto esta, e o facto de se ter tornado maior que o próprio filme a cuja banda-sonora pertencia.
97º Lorde- "Tennis Court" (2013)- Ainda "Royals" não se tinha transformado no colosso que hoje conhecemos, e já "Tennis Court" comprovava o prodígio de Lorde. Minimalista expressão art pop de pulsação electrónica, o tema lida com os anseios e os aspectos negativos da fama recém-encontrada ("how can I fuck with the fun again when I'm known?"), sem esquecer a crítica ao superficialismo da indústria em que se via inserida ("don't you think that it's boring how people talk?"). O facto de Lorde ter escolhido um vídeo tão inquietante para o ilustrar, deu-lhe todo um outro arrojo.
96º Justin Bieber- "Love Yourself" (2015)- O ano era 2016 e ninguém queria acreditar que o jovem Biebs havia evoluído para um artista pop digno de ser levado a sério. Mas o milagre aconteceu uma vez. E uma segunda. E à terceira já todos respondíamos aos sintomas da Bieber fever. "Love Yourself", uma aveludada composição acústica produzida por Benny Blanco e escrita por Ed Sheeran, em parte gentil e em parte agreste para com uma ex-namorada, permanece como o momento mais ubíquo na improvável aclamação de Justin.
95º Taylor Swift- "Wildest Dreams" (2015)- Um disco tão fantástico quanto 1989 tinha necessariamente de gerar uma campanha promocional extensiva: só assim se explica o facto de ter chegado ao primeiro ano de vida com tamanha vitalidade, encabeçado por um quinto single pelo qual todos torciam desde o início. Em "Wildest Dreams", Taylor canta em apaixonante embalo dream pop sobre o desejo de fazer perdurar na memória os melhores momentos de um romance condenado a terminar. É dramático, épico e absolutamente lindo.
94º Flume feat. Vince Staples & Kučka- "Smoke & Retribution" (2016)- O segundo álbum da vida de Harley Streten é recordado sobretudo por "Never Be Like You", mas a jóia de Skin (2016) está neste pedaço über cool de future bass e electro-hop comandado por uma performance inflamada de Vince Staples - a plantar estacas para o vindouro Big Fish Theory (2017) - e adoçicado pela vocalização angelical da australiana Kučka.
93º Sam Smith- "Lay Me Down" (2013)- A primeira vez que escutámos Sam Smith pode ter sido pela mão dos Disclosure, mas seria com "Lay Me Down" que conheceríamos em pleno a sua identidade: a de crooner soul das amarguras do coração. E as coisas dificilmente ficam mais tristes que isto, num tema avassalador sobre as implicações de um amor não correspondido que chega ao extremo de desejar que a união que não foi possível em vida, seja cumprida na morte. Dói, dói...
92º Carly Rae Jepsen- "Run Away with Me" (2015)- Ninguém dava um centavo por Carly Rae Jepsen depois do êxito de "Call Me Maybe" - e talvez esse tenha sido o maior trunfo na forma como se superou e ao rótulo de one-hit-wonder com um dos melhores álbuns pop da década. O culto é explicado em parte por "Run Away with Me": uma jubilosa construção dance pop de saxofone em riste com precisão sueca, sobre largar tudo e partir à aventura com a outra pessoa que mais nos completa neste mundo. É o sucessor natural de "Teenage Dream", esmagando-nos. A. Cada. Segundo.
91º Lorde- "Green Light" (2017)- Esperámos todos pela maturação de Lorde, sabendo que eventualmente seria melhor do que aquilo que tínhamos sonhado. "Green Light", ainda um dos últimos inventivos singles pop da década, reforçou-o: uma febril composição electropop de piano esbaforido e kick drum cardíaco, entre a recordação e a incapacidade de abandonar um desgosto amoroso, e a sensação de liberdade e esperança que advém de finalmente o ultrapassar. Seria apenas a ponta solta de um álbum tão fabuloso e transformador quanto Melodrama.
90º Billie Eilish- "Bad Guy" (2019)- O fenómeno em torno de Billie Eilish já estava a fermentar há pelo menos dois anos quando "Bad Guy" a catapultou para a estratosfera, enquanto destacadíssima líder da geração Z: uma agitada construção pop-trap de ambiência gótica conduzida por estalidos de dedos, um baixo para-lá-de-cool, bombo cardíaco e melodia diabólica, sobre fazer pouco de pessoas que pensam ter uma reputação a defender. A arrojada mutação final da canção adquire contornos de Yeezus (2013) - é a medida em que os limites da pop são esticados em 2019.
89º Kim Petras- "I Don't Want It at All" (2017)- Por alguma razão não totalmente descortinada, algumas das melhores canções pop dos anos 10 pertencem a projectos em vez de álbuns. Como Number 1 Angel ou Pop 2 de Charli XCX ou a designada "era néon" que apresentou Kim Petras ao mundo. "I Don't Want It at All" é nada menos que um formidável single de estreia dance pop de heranças 80s, assente nos mesmos mandamentos de consumismo e ostentação de "Material Girl". Woo-ahh!
88º Tinashe feat. Schoolboy Q- "2 On" (2014)- Depois de uns quantos anos formativos a editar mixtapes que ajudaram a construir o culto, Tinashe lançava-se para o estrelato no início de 2014 com uma canção tão fantástica quanto "2 On", à base de uma estonteante produção electro-R&B de DJ Mustard, um sample de "We Be Burnin'" de Sean Paul e de uma melodia vocal divinal, com o condão de conseguir devolver ao mainstream os vídeos fortemente coreografados. Infelizmente, não voltaria a atingir o mesmo patamar de aclamação comercial.
87º M83- "Midnight City" (2011)- O projecto do francês Anthony Gonzalez já levava dez anos de obra editada quando "Midnight City" se tornou no estandarte da sua discografia: uma imensa odisseia synthpop dreamy sobre a beleza da cidade de Los Angeles à noite, que deve muito do seu encanto à forte distorção vocal que é utilizada como riff central da canção, e ao sensacional solo de saxofone que a encerra.
86º Clean Bandit feat. Jess Glynne- "Rather Be" (2013)- Este tema é uma extraordinária combinação de factores felizes: uma banda que procura fundir electrónica com elementos de música clássica; uma vocalista debutante que entrega uma pujante performance reminiscente de Natasha Bedingfield; um vídeo inteiramente caseiro que por algum motivo se torna viral; e uma canção de amor tremenda capaz de colocar sempre um sorriso na cara de quem a escuta. Magia, pura magia.
85º Birdy- "People Help the People" (2011)- Há quase um empate técnico entre "Skinny Love" e "People Help the People" pelo título de melhor single do debute alado de Birdy, mas a ressonância emocional dá ligeira vantagem à segunda, talvez porque o original dos Cherry Ghost não esteja tão presente na memória quanto o de Bon Iver. Seja como for, a delicada releitura folk que a pequena faz de um tema tão importante sobre a necessidade de ajudar o próximo, é comovente.
84º Rae Morris- "Do You Even Know?" (2014)- Rae Morris acaba a década enquanto uma das mais arrojadas e singulares intérpretes pop do Reino Unido, em oposição à tímida e delicada cantautora que emergiu com uma série de EPs. O momento de ruptura deu-se algures no meio com "Do You Even Know?", uma hercúlea composição art pop/synthpop forjada por Ariel Rechtshaid sobre o desconforto e a estranheza de se ser alvo de julgamento, que aos poucos encontra liberdade e confiança na constatação de que tal não importa. Combatendo o desconhecido, Rae encontrava-se.
83º The Weeknd feat. Daft Punk- "Starboy" (2016)- Depois de uma gloriosa ascensão ao topo do mainstream, o cavaleiro das trevas renunciava ao seu posto com uma sofisticada e tenebrosa construção electropop e R&B assistida pelos Daft Punk, que lidava com as complicações da fama ao mesmo tempo que tentava enterrar a persona que Beauty Behind the Madness (2015) ajudou a erguer. Não que fosse muito bem-sucedido no processo: daqui Abel Tesfaye só ficou maior, mais amplo e errante.
82º Ellie Goulding- "Love Me Like You Do" (2015)- Ellie Goulding vinha a crescer de single para single e álbum para álbum, até alcançar o seu pináculo com "Love Me Like You Do", a sua contribuição para a banda-sonora de Fifty Shades of Grey e a sua enésima para sagas da Sétima Arte. Mas esta seria especial. Nem a própria poderia ter adivinhado aquilo em que se tornaria: um sonho lindo em forma de grandiosa balada de produção atmosférica na tradição de Phil Collins, íntima, luxuriante e arrebatadora, na qual queremos viver para todo o sempre.
81º Ciara- "Body Party" (2013)- Uma slow jam com assinatura de CiCi dificilmente fica melhor que isto. "Body Party" funcionou como uma reinvenção para Ciara numa altura em que o público já a havia de certa forma abandonado e a crítica deixado de ter razões para a aclamar. Bastou-lhe um sensacional sample de "My Boo" (1996) dos Ghost Town DJ's e um notável trabalho de Mike Will Made It na mesa de mistura para a devolver momentaneamente aos píncaros da estreia. Deverá ser o seu outro motivo de orgulho da sua história com Future, para além do filho.
80º London Grammar- "Strong" (2013)- É impossível não pensar em 2013 como um ano mágico sem o anexar ao trabalho dos London Grammar. O trip hop que os caracteriza ganhava expressão com "Strong", uma belíssima canção com ecos de Massive Attack, ancorada no desalento de alguém que vê o seu parceiro a afastar-se e a mimetizar o comportamento da figura paterna, dando continuidade a um ciclo de dor e abandono. Mas é a magnífica voz de Hannah Reid, portento de força e emoção, sobre a qual tudo gravita.
79º Miguel- "Coffee" (2015)- Miguel Jontel Pimentel tem o condão de cantar a intimidade como ninguém. Logo depois de "Adorn", "Coffee" é o tema mais admirável que assinou esta década, uma proclamação da harmonia a dois por entre o vale dos lençóis, entregue com júbilo e volúpia numa estonteante composição R&B e soul por si mesmo produzida. Wildheart (2015), o álbum que se seguiu, é igualmente estonteante.
78º The Maccabees- "Feel to Follow" (2011)- Na viragem para 2012, "Pelican" e, sobretudo, "Feel to Follow", davam a entender que vinha aí o álbum mais consistente dos Maccabees. O arrebatamento deste último, então, não se mede por palavras: piano e bateria indutores de transe que conduzem a um refrão incisivo, apenas para desembocar num vendaval de guitarras picadas que melhor se entende de olhos fechados. Seria o tipo de desbravação sónica que valeria a Given to the Wild (2012) a menção ao Mercury Prize desse ano.
77º Ariana Grande feat. Iggy Azalea- "Problem" (2014)- Poderíamos alegar que a estreia de 2013 foi tão breve que nem deu para ver o fogo que a música de Ariana prometeu, por isso aí a tínhamos no ano seguinte a declarar as suas intenções de um dia vir a governar isto tudo. "Problem", uma agitada prosa dance pop e R&B sobre o receio de tentar reacender a química com um ex, permanece um single incrível com as suas heranças 90s, o loop de saxofone e os trompetes, os sussurros de Big Sean, o rap de Iggy Iggz e um refrão gigantesco que nenhuma outra vocalista se atreveria a entoar.
76º James Blake- "Retrograde" (2013)- Suddenly we're hit. A forma como James Blake consegue editar um segundo álbum ainda melhor que o primeiro, é espantosa. A contribuir para tal, logo um cartão-de-visita tão assombrosamente belo quanto "Retrograde", que retém os digitalismos soul e expande as heranças R&B do músico inglês, sendo capaz de cristalizar tudo em seu redor - um pouco à semelhança do que acontece no vídeo - de tão magnífico que é.
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