AO VIVO: Isaura + Francis Dale, Lux Frágil


Novos valores da música portuguesa enchem o clube lisboeta em noite de arranque da digressão conjunta. 

A ideia de ver e ouvir ao vivo no mesmo palco duas das maiores promessas ao serviço da música nacional contemporânea era demasiado tentadora para deixar passar em vão. Foi o que terão pensado centenas de pessoas que na quinta-feira passada acorreram ao sempre concorrido Lux Frágil na noite que marcava o início da digressão colaborativa entre Isaura e Francis Dale.

Ela, em ano de debute a florescer nos terrenos da pop electrónica com o formoso EP de estreia Serendipity. Ele, com um ligeiro avanço no contador (fruto de dois lançamentos de curta-duração), a afirmar-se enquanto guardião da soul digital. Propõem um encontro entre dois mundos que por uma noite podem conviver lado-a-lado sem que se anulem.

E a verdade é que o que os une é muito mais do que aquilo que os separa - canções em que a electrónica é o ponto de partida para um infinito particular. Canções que falam de (des)amor, encontros fortuitos, desencontros e que nascem tanto de estados mais febris ora apaziguantes de alma. Canções que pedem para ser partilhadas e abraçadas num respirar colectivo.

A eles juntam-se Ben Monteiro (parte integrante dos D'Alva e Mount Keeper nas horas vagas) nos teclados e ocasionalmente guitarra, e Fred Ferreira (militante nos 5-30, Orelha Negra e Banda do Mar) a trocar a habitual bateria pelo mais discreto drum pad. Ambos alinham no motivo visual do espectáculo: Ben de branco e Fred de negro, cada um posicionado em palco conforme o figurino que envergam. 

O concerto segue um princípio institucional de "ora agora canto eu, ora agora cantas tu", tornando possível a tal ideia de comunhão pacífica e não intrusiva. Tanto um como o outro não têm que lutar pela atenção do público, generoso no afecto para com ambos, mas sim pelo entendimento com o técnico de som - elemento que se quer invisível nesta equação, mas que por demasiadas vezes é invocado de modo a erradicar as constantes perturbações que se foram sentindo ao longo do espectáculo. 

Com Francis Dale as atenções são repartidas entre Lost in Finite, o EP de estreia a cumprir entretanto dois anos, e o recente Square, editado em Maio último pela NOS Discos. As canções do primeiro apresentam-no como estudioso de Prince e talvez puxem mais pelo público, particularmente entusiasta em "Pie In the Sky" - com direito a impressionantes vocalizações do músico - e "Burning", e um pouco mais contido para com as do novo trabalho, a trazer algum do minimalismo electrónico de James Blake ao seu universo, sentido em momentos como "If You Don't Want Me" ou "Poème Électronique". 

Na galáxia de Isaura habitam ainda apenas as canções de Serendipity. O arranque com "Dancefloor" induz a plateia num transe pacífico e aos primeiros acordes da synthpop luminescente de "You're All My (Heart)", uma das mais celebradas do EP, já tem o público nas mãos. Seguem-se a emotiva "Lost" a mergulhar a sala num silêncio sepulcral, de peito aberto para receber as confissões da intérprete; um "Change It" aclamado mas maltratado pelos problemas de som e a apaixonante "Useless", canção com que iniciou o seu percurso, suportada pelo coro da plateia. Há ainda espaço para uma reinvenção de "Love Me Harder" de Ariana Grande em invólucro trap, que não soou tão bem quanto a versão 1.0 que se escutou no concerto de apresentação do Musicbox em Abril passado. Mas Isaura está decididamente mais confiante e desinibida desde então. 

Para o encore fica reservado a versão conjunta de "Eleanor", cartão de visita do novo EP de Francis Dale, e as celebradas tréguas de "Change It", com direito a esforçado sing-along do público. Boa atmosfera, excelente interacção com a plateia, entrega e felicidade estampada no rosto pelo facto da aventura bidimensional ter começado da melhor maneira. Daqui seguem por esse país fora. 

Para terem um cheirinho do que lá se passou, fiquem com a versão francisaurale de "Eleanor" cantada ao vivo na Vodafone FM:



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