Bastille e as mágoas alheias, parte III


A brincadeira remonta aos primórdios da banda. Antes de existir Bad Blood, os Bastille dedicavam-se à criação de mixtapes - experiências de laboratório, leia-se - que ousaram designar de Other People's Heartache. Os primeiros dois capítulos foram lançados no decorrer de 2012 e deram-nos pérolas como "Requiem for Blue Jeans", "Of the Night" - entretanto recuperada na reedição do álbum de estreia - ou "No Angels" com Ella Eyre, favorita dos fãs em concerto.

A aventura conhece agora um terceiro volume, desta feita sem recurso a recriações alheias mas com o espírito de partilha (se bem que o VS. dá assim um certo ar competitivo à coisa) de outrora. A intenção é deixar os fãs entretidos enquanto o novo disco de originais não chega e, claro está, desviarem-se um pouco da norma. E este é, sem dúvida, o formato certo para o fazer.

"Fall Into Your Warms" é a prequela fugaz do vindouro "Weapons", um bonito momento orquestral cortesia do The Gemma Sharples Quartet; "Bite Down" é um dos pontos altos do registo, com a indietronica do quarteto britânico a fundir-se à pop rock ritmada das manas Haim - tem potencial para se vir a tornar numa futura "No Angels" e, quiçá, para escalar a Hot 100. Ao virar da esquina reencontramos "bad_news", apresentada como lado B de "Oblivion", e que aqui recebe um desanimador contributo de MNEK, que bem tenta injectar algum soul na produção electrónica do grupo, mas sem sucesso. É o parceiro errado na canção certa. Segue-se "The Driver" a conservar o embalo épico do registo de estreia mas a desbravar caminho em terrenos de folk/blues, com a guitarra em modo faroeste.



Em "Axe to Grind" acontece o primeiro escorregão. Parece ser uma tentativa falhada de fazer club music com rap (muito duvidoso) de permeio, mas que nem incentivaria o mais desesperado dos noctívagos a utilizá-la como método para atrair atenções na pista de dança - merece ir directamente para o baú de tesourinhos deprimentes. Felizmente que à espreita está o efusivo "Torn Apart", que nasce da mesma costela eurodance via 90's que "Of the Night" e facilmente passava pelo single de apresentação do 2º álbum. 



A mesma canção tem direito a um interessante posfácio que desemboca numa rave house e que conta com um breve mas explosivo rap feminino de Lizzo a fazer lembrar a controversa Azealia Banks; "Weapon" destina-se a franzir sobrancelhas pelo arrojo com que foi construída: Dan Smith e companhia à solta num electro rap - cortesia de Angel Haze - percussivo que entretanto segue para uma secção de PBR&B com Braque a fazer a sua melhor impersonação de Miguel. Pode ser altamente contestável, mas eu cá acho que é uma das melhores coisas que já fizeram até hoje. A fechar a mixtape temos "Remains", com uma interessante repartição do microfone entre Dan Smith, Rag N Bone Man - novamente a dar aquela atmosfera blues - e uma irrepreensível Skin dos Skunk Anansie, a tornar completamente sua e da banda uma canção que começou por ser o "Things We Lost in the Fire 2.0" dos Bastille. 



Ora aqui está uma bela mixtape: não aponta necessariamente caminho para o álbum que há-de vir, mas vê o quarteto britânico a expandir a sua formação e a alargar o seu lote de influências, o que se pode vir a revelar útil no momento de tomarem decisões mais expeditas no próximo LP. Até lá, isto servirá para acalmar os anseios de quem, como eu, ainda lhes auspicia um futuro promissor.

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