REVIEW: Sky Ferreira- Night Time, My Time

 
Após anos de luta incansável por um lugar ao sol, parece que a hora de Sky Ferreira finalmente chegou. Foram 5 anos de espera, encaixotada algures nas prateleiras mais recônditas de uma grande editora, aguardando luz verde para editar o seu álbum de estreia. Pelo meio editou 2 EPs, trabalhou com um vasto leque de produtores e experimentou uma série de géneros musicais - reza a história que compôs mais de 400 canções, das quais apenas 12 apenas figuram no derradeiro alinhamento. Há uma pergunta que se impõe: quem é Sky Ferreira em 2013? Night Time, My Time contém a resposta:
 
1) Boys- Partilha o mesmo título de uma das suas primeiras canções, ainda nos meandros de uma pop/rock insípida, daí que seja um tanto ou quanto irónico iniciar o disco com esta alusão ao seu passado. Só que agora é o shoegaze e uma noise pop próxima dos Sleigh Bells quem mais ordenam, numa canção em que Sky agradece a uma figura masculina por lhe ter restaurado a fé nos homens. (7/10)
 
2) Ain't Your Right- Sem grandes aspectos a salientar, conserva a tónica do tema anterior com Sky a conferir uma aura penosa, uma espécie de lamento assombroso, aos versos que canta. É interessante, mas não quero que o álbum se alongue demasiado nesta via. (7/10)
 
3) 24 Hours- E eis que entram em cena as influências dos anos 80, naquilo que parece ser uma valente piscadela de olho a uma Kim Wilde em início de carreira. É o primeiro tema que me fica a pairar na cabeça, razão essa a que o potente refrão não é alheia. Está expressa a vontade de prolongar infinitamente aquilo que obviamente não se pode controlar- a passagem do tempo. (8/10)
 
4) Nobody Asked Me (If I Was Okay)- É um dos pilares do disco, imprescindível para se compreender o que vai na mente de Sky Ferreira. É como se todas as angústias da adolescência estivessem condensadas nele, com a cantora a repetir incessantemente o título da canção. É confessional, com alguma ira à mistura, mas mesmo assim consegue ser festivo de certa forma. (7/10)
 
5) I Blame Myself- A porta do coração está aberta e as confissões surgem em catadupa: "how could you know what it feels like/to fight the hounds of hell?" ou "to be outside yourself?", afirmando ser a principal culpada pela sua reputação. É o primeiro grande momento do álbum, pop cintilante com pinceladas new wave e que evoca Madonna dos anos 80. (9/10)
 
6) Omanko- É difícil levar a sério um tema que anda à volta de um "Japanese Jesus" qualquer e que bate na mesma tecla para levar a cabo outras conotações pouco elogiosas. Não foi de certo uma inspiração nipónica que invadiu Sky Ferreira, creio que deve ser uma tentativa de emular algo ou alguém. Nem sei o que lhe chamar - synthpunk? Um "Ray of Light" servido em flashes auditivos? Mas sabem que mais? É estranhamente viciante. (6/10)
 
7) You're Not the One- Não me cativou particularmente quando foi lançada como 1º single, talvez por não estar à espera que Sky seguisse este caminho, mas desde então tem crescido a cada nova audição e actualmente considero-a uma bela de uma canção. Transpira anos 80 por todos os poros e Sky serve-a de forma lânguida, em modo femme fatale. Bang bang, you shot me down. (8/10)
 
8) Heavy Metal Heart- Nem por sombras é metaleiro como o título sugere, bem pelo contrário, é uma paixão assolapada que faz vir ao de cima o coração metaleiro da cantora. Sente-se de novo a atmosfera noise pop, aqui talvez com ligeiras essências de electro rock não muito distantes de uma Natalia Kills. Recebe a prestação vocal mais inspirada até ao momento. (8/10)
 
9) Kristine- É certo que nada bate a estranheza de "Omanko", mas este "Kristine" não lhe fica nada atrás. Faz-me lembrar a tempos a indietronica peculiar dos Foster the People com uma veia rock mais aguerrida, à qual não faltam versos igualmente estranhos sobre a vida dos jovens milionários (?) de que "Kristine" faz parte. E não consigo parar de pensar que isto dava um quickstep muito marado. (7/10)
 
10) I Will- A determinada altura o agora intitulado Night Time, My Time esteve para se chamar I Will, daí que estejamos perante outro dos temas centrais do álbum. É incendiário, veloz e parece especialmente sincero quando Sky afirma "when it's with me your messing/I'm gonna teach you a lesson". Faz-me acelerar a pulsação - é o meu tema favorito, pois claro. (9/10)
 
11) Love in Stereo- É, a par de "I Blame Myself", o tema que melhor captura a essência dos seus trabalhos passados, um apetitoso bombom synthpop/new wave com uma cobertura algo agridoce, ou não estivesse Sky a cantar de forma terna a alguém que lhe partiu o coração. (8/10)
 
12) Night Time, My Time- Esqueçam a parte em que disse que nada batia a estranheza de "Omanko". Há sim. E esteve guardado este tempo todo para me atormentar mesmo nos minutos finais. Emana vibrações de um qualquer ritual nocturno e a certa altura adquire contornos dignos de um filme de terror. É de fugir a sete pés. (4/10)
 
Para compreendermos Night Time, My Time temos que perceber que a história de Sky Ferreira difere da maioria das estrelas pop que a determinada altura enfrentam uma revolta interior que as leva por caminhos questionáveis. Não é esse o caso. A vida de Sky nos últimos 5 anos tem sido tudo menos um mar de rosas: de pouco ou nada lhe serviu ter um contrato discográfico assinado com uma grande editora aos 15, se nos anos seguintes a sua carreira nunca chegou a descolar. Prometeram-lhe mundos e fundos. Apelidaram-na de "a próxima grande cena". Forçaram-na a mudar a sua identidade artística para singrar mais facilmente neste mundo. Viveu de avanços e recuos. Ouviu centenas de nãos. E o tempo passou...
 
Todo este processo frustrante terá contribuído para a natureza lírica e sonora de Night Time, My Time, que está longe de ser o típico álbum de estreia de uma dita artista pop: é caótico, barulhento, amargurado, tempestuoso e ligeiramente triste. Talvez porque não seja um álbum de estreia propriamente dito: são as palavras que há muito tempo, demasiado tempo, ansiavam pela libertação e que agora brotam em catadupa numa torrente intempestiva de noise pop, electro rock e algum shoegaze à mistura. Eu próprio tive dificuldade em ambientar-me ao álbum, talvez porque, como tantos outros, estava demasiado agarrado ao seu último EP e à espera de temas da laia de "Everything Is Embarrassing" ou "Sad Dream".
 
Mas não. Quanto muito a atmosfera do seu primeiro longa-duração evoca  "Red Lips" ou "Lost in My Bedroom" como o caminho a seguir. Desta vez não há Dev Hynes e os seus pós mágicos. Apenas Ariel Rechtshaid (que só este ano já deixou a sua marca nos álbuns das manas Haim, Charli XCX, Vampire Weekend ou Snoop Lion) e Justin Raisen entram a bordo, guiando Sky por territórios inóspitos e inesperados. Mas agora já sabemos que não poderia ter sido de outra forma: face às circunstâncias, este era o único álbum que Sky poderia ter feito - vulnerável e cru. Acredito que esta sonoridade não a definirá para o resto da sua carreira e que, a certa altura, já livre dos tormentos que a assolam, fará um excelente disco pop.
 
Classificação: 7,3/10
 
Sigam o blog através do facebook, na seguinte página criada para o efeito.

Comentários

Mensagens populares