2013: Um Balanço Sónico- Parte IX

  As figuras  

Lorde

Não me recordo da última vez em que uma artista-revelação tenha marcado de forma tão indelével um ano como este que agora termina e em que Lorde foi uma das figuras de proa. Ainda mais impressionante é o facto de ter vindo de nenhures, que é como quem diz de Auckland, nos confins da Nova-Zelândia, e do alto dos seus 16 anos, ter-se batido de igual para igual com os vários nomes sonantes da indústria. E ter-lhes dado uma valente abada.

Corria o mês de Março quando, sem que nada o fizesse prever, "Royals", objecto de estranho apelo, voou disparada para o nº1 da tabela de singles do seu país natal, acompanhado de um EP - The Love Club - com 4 outros temas de génese igualmente intrigante. Sem informações de grande relevo e nenhum vídeo a acompanhar a canção, fazia-se apenas acompanhar por uma ilustração sua - uma rapariga com coroa e uma ratazana ao colo. Bastante esclarecedor, portanto.

Pouco depois o sucesso alastrou-se ao resto dos Antípodas - com a Austrália a ser contagiada pelo fenómeno - e num abrir e fechar de olhos já estava a escalar os topes dos EUA, onde eventualmente chegaria ao nº1 - lugar que ocupou durante 9 semanas consecutivas - tornando-se na primeira artista a solo neo-zelandesa a conseguir a alcançar o topo da tabela americana. A Europa veio logo a seguir. De arrasto chegaram mais 2 singles - "Tennis Court e "Team" - e Pure Heroine, o álbum de estreia que a confirmou definitivamente como uma das grandes revelações do ano.

Sem grandes truques comerciais por detrás, importa perceber como Lorde chegou tão longe. Simples. Num panorama musical construído à base de ilusões, clichés, hipocrisia e ostentação, Lorde tornou-se a óbvia alternativa aos males que inundam o circuito mainstream, a voz de uma nova geração que não se revê na cultura pop que a TV e a internet, acima de tudo, disseminam. Não aparenta ser mais do que é. É uma adolescente comum a tantas outras que faz das suas vivências mundanas a tela perfeita para as suas fascinantes criações, ora povoadas por um balanço hip hop ou electrónica minimalista.

É capaz de ter sido a melhor coisa que aconteceu à música em 2013. A resposta às preces de quem procurava uma pop mais substancial. A autenticidade que há muito escapava, preterida em detrimento de marionetas desprezíveís. É uma de nós - a heroína que em boa hora salvou isto tudo. Mil vivas para Lorde.

  As canções nacionais  

Brass Wires Orchestra- "Tears of Liberty", Cornerstone

A vaga folk que desde 2008 se tem feito sentir no panorama musical graças ao mediatismo de projectos como Noah and the Wale, Fleet Foxes, Beirut ou Mumford & Sons, parece ter chegado de vez a este lado do Atlântico. Não sei ao certo se os BWO serão pioneiros na folk made in Portugal, mas pelo menos são a primeira banda do género a alcançar um relativo patamar de sucesso. O maravilhoso "Tears of Liberty" é um dos singles sonantes que antecede o seu álbum de estreia e a emoção que transmite é deveras palpável - arde no peito. Que façam altos voos em 2014.



Deolinda- "Seja Agora", Mundo Pequenino

Gosto dos Deolinda desde que apareceram, já há 5 anos atrás, com Canção ao Lado. Desde então têm feito um percurso fenomenal, em crescendo, e actualmente são um dos valores seguros da música portuguesa. "Seja Agora" não só é um recado ao Portugal contemporâneo, que precisa de agir, passar das palavras aos actos e lutar por um amanhã melhor, como foi o hino inspirador a que mais recorri em 2013. Porque "o que tem de ser tem muita força" e "no futuro só quem decide é a vontade". E a minha diz-me para continuar a guardar os Deolinda na mão por muitos e bons anos. 



Gisela João- "Meu Amigo Está Longe", Gisela João

Percebo que não seja uma escolha convencional. Mas acontece que nada em Gisela João é convencional - graças a uma boa dose de irreverência e genuinidade, veio alterar o paradigma do fado tradicional, aquele de semblante carregado e xaile nos ombros que é sinónimo de sofrimento. E depois há aquela voz imensa, profunda e ancestral, quase demasiado grande para um corpo tão pequeno, cuja força reside na dimensão que atribui às palavras que brotam do seu âmago. Ninguém mais poderia ocupar este lugar senão ela - pela força com que me atingiu e por me ter feito descobrir encantos que jamais sonhei encontrar num fado que ela própria tornou contemporâneo e próximo de uma nova geração. E isto é apenas o início do brilhante destino de Gisela João.



  Os álbuns  

Justin Timberlake- The 20/20 Experience

Nada se compara à felicidade que me trespassou no dia em que soube que Justin Timberlake tinha colocado um ponto final no seu hiato de quase 7 anos e estava finalmente pronto para voltar ao seu estado natural, de onde, francamente, nunca se deveria ter afastado. O resultado da espera materializou-se em The 20/20 Experience, a primeira parte (e mais memorável, também) de uma aventura discográfica dividida em dois tomos.

Sem querer repetir a incursão pelo universo da pop electrónica, que explorou de forma revolucionária em FutureSex/LoveSounds, JT aventurou-se pelos meandros da neo soul (um misto entre R&B e soul contemporânea com influências de jazz, pop, funk e hip hop) e em temas de longa duração ritmicamente elaborados e ambiciosos, sempre sob a batuta do mago Timbaland, o habitual parceiro do crime.

E o certo é que entre as orquestrações clássicas e o toque moderno de R&B/soul presente em "Pusher Love Girl", "That Girl" e "Suit & Tie", o exotismo sensual de "Don't Hold the Wall" e "Let the Groove Get In", que mantêm vivo o legado de Michael Jackson,  o electro-R&B quase porno de "Tunnel Vision" e "Spaceship Coupe", a pop  sincopada de "Strawberry Bubblegum", a pérola reluzente e magistral que é "Mirrors" e a belíssima "Blue Ocean Floor", que encerra o disco de forma etérea, este acaba por ser o álbum mais aventureiro e ecléctico de JT, apenas não tão competente na forma como o seu antecessor apontava novos caminhos para a pop.

Não obstante isso, cumpriu as muitas expectativas que nele eram depositadas. É um disco fabuloso que me enche as medidas e prova porque razão Justin Timberlake continua a ser o melhor do seu campeonato.

Pontos altos: "Let the Groove Get In", "Don't Hold the Wall", "Mirrors" e "Blue Ocean Floor"

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