Zaba, a Selva Tropical dos Glass Animals


Há meses que ando para falar do disco de estreia dos Glass Animals, mas ora me falta tempo ou coragem. Como nem todos os dias podem ter 25 horas e os desafios existem para ser superados, aqui estou eu para fazer o que ainda não foi - e deve - ser feito. 

Gosto de pensar neste quarteto de Oxford como uma versão mais exótica e esquizóide dos conterrâneos Alt-J, com uma costela demarcadamente tribal e um ADN sonoro que conjuga indie pop, psicadelismos, R&B e balanço trip hop. Foram apadrinhados no ano passado por Paul Epworth, mega-produtor da cena indie, que os levou a assinar pela sua Wolf Tone e emprestou a sua visão ao registo de estreia do grupo editado em Junho último. E isso por si só é já um sinal de qualidade.

Zaba é uma verdadeira selva repleta de lugares inóspitos, criaturas bizarras, vegetação abundante e clima abafado, em que cada audição é sinónimo de uma nova descoberta. Não é um disco fácil nem imediato, mas marca pontos pela singularidade e por pensar e executar de forma diferente e pouco ortodoxa.



"Flip" oferece-nos um início sedutor e imersivo, dreamy e em crescendo tribal, que explode a meio minuto do fim; "Black Mambo" é o tema que os Alt-J se esqueceram de incluir em An Awesome Wave, construído à base de um xilofone, cordas cristalinas algo jazzísticas, atmosfera nebulosa e uma voz que é puro veludo. Era capaz de ouvi-la em repeat durante meses a fio. "Pools" tem trejeitos de ritual de iniciação no clã e encapsula todos os cheiros, cores e sons da selva. "Gooey" consegue ser ainda mais dengoso e minimal que "Black Mambo", convidando a descobrir as profundezas da selva e os mistérios que lá habitam.



As alucinações dão-se ao som do vaporoso e ligeiramente sinistro "Walla Walla" ("all these creatures are a lie/ I clap my hands and they're gone into the night") e a fazer a ponte entre o final da primeira metade do disco e o início da segunda temos "Intruxx", instrumental que nos leva numa viagem de canoa até ao outro lado da selva. "Hazey" proporciona-nos o mesmo tipo de encantamento sereno que "Black Mambo", mas tem uma aura mais obscura e voraz, bem como uma série de influências hip hop e R&B que fazem dela a canção mais expedita de Zaba.

Daqui em diante o álbum perde consistência e começa a tornar-se repetitivo: "Toes" soa a Alt-J num dia de fraca produtividade; "Wyrd" é indiscutivelmente a mais fraquinha do alinhamento; "Cocoa Hooves" é um dos poucos temas a ser ornamentado com guitarra e parece reflectir o estado de demência de quem já está exilado há demasiado tempo ("why don't you dance like you're sick in your mind?/ why don't you set your wings on fire?") e a fechar temos o pouco digno "JDNT", que nos abandona num reles descampado. A selva é agora uma miragem, fruto de um sonho estupendo ou de um pesadelo bom. 



Não sei de que planeta vieram os Glass Animals, mas sinto que encontrei aqui uma banda para a vida. Gostava apenas que tivessem trabalhado melhor a segunda metade do álbum, condensando as ideias de forma mais coesa. De qualquer forma, já ninguém me demove de pensar que estamos perante uma das estreias do ano, por muito despercebida que esteja a passar. Entre o coaxar de rãs, cantos de aves exóticas, gorgolejar de fontes e uma miríade de ruídos indecifráveis, este é um mundo que vale a pena explorar, permanecer e ver como se desenvolverá no futuro. 

Classificação: 8,1/10

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